quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Diz o ditado...

"portenhos* são italianos que falam espanhol, pensam que são britânicos e desejam ser franceses"...

O ditado popular acima pode parecer engraçado, mas traz consigo um viés muito comum do etnocentrismo: o estereótipo .

Estereótipo é um tipo de falácia que favorece a generalização de uma ou mais qualidades de alguns indivíduos, para o grupo como um todo. 
No comportamento contaminado pelo etnocentrismo, há forte tendência para nos acharmos melhores que 'o outro'. E de fato, há vários modos disso acontecer, psicológica ou sociologicamente. Em quais sentidos podemos nos pensar melhores que 'o outro'? quando pensamos que nossa religião é melhor que a do outro, que somos mais inteligentes (ou mais sábios ou mais espertos), que temos mais bom gosto e bom senso que o outro, que somos mais 'civilizados' que o outro, e assim por diante...

De modo geral, todas as etnias têm essa tendência em maior ou menor intensidade (embora nem todos os indivíduos pertencentes a tais grupos assim se comportem).

Não se sabe ao certo como um estereótipo surge, como cresce ou como se o erradicaria. O que se sabe é que estereótipos são gerados no âmbito da complexa relação mente/cérebro e tem lá suas utilidades práticas. O problema surge quando a capacidade de estereotipar (útil para a interação social do animal humanóide) se associa com o etnocentrismo (que, por sua vez, decorre de comportamentos aprendidos socialmente). É o caso evidente do dito popular supramencionado.

O mesmo fenômeno associativo ocorre no caso do racismo (seja ele contra o negro, por parte do sujeito não-negro; contra o indígena, por parte do não-indígena; seja contra o brasileiro, por parte do não-brasileiro). Não nascemos racistas, nem somos racistas devido a algum tipo de imperativo biológico. Mas nascemos sim com capacidade mental/cerebral para 'discriminar'. 
Nosso cérebro é muito eficiente nesta tarefa... e tal capacidade já era bastante útil naqueles remotos momentos da caça primitiva, essencial para a sobrevivência dos primeiros grupos humanos de modo geral (já que auxilia na tomada de decisões em caso de perigo ou de oportunidade). Ainda hoje, trata-se de qualidade fundamental se quisermos apresentar bom desempenho no contexto da sobrevivência social. 

Porém, a partir dessa 'capacidade discriminatória', agregam-se influências socioambientais, a partir das quais desenvolvemos (ou não) o racismo (que se trata de um dos tipos de discriminação). Noutras palavras, nascemos discriminatórios, e bem depois "aprendemos" racismos.

moral da história: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Não se deve confundir o biológico com o antropossociológico; antes, deve-se buscar compreender suas interações de um modo um pouco menos superficial. Urge desaprender etnocentrismos inúteis. O paradoxo: Só compreendendo profundamente que não somos superiores é que de fato o seremos em algum sentido.


Silvio M. Maximino



* portenho é um adjetivo que refere-se aos argentinos habitantes ou nascidos em Buenos Aires.

Nenhum comentário:

Postar um comentário