quarta-feira, 26 de junho de 2013

Somos o povo borra-botas?- parte II

Opinião1 - Jornal da Cidade - Bauru

Somos o povo borra-botas?

parte II


Há dois anos (edição do JC de 26/7/2011*), escrevi um texto buscando responder à intrigante pergunta do jornalista espanhol Juan Arias, no jornal El País: por que os brasileiros não reagiam diante da corrupção de seus políticos?

Só para citar os casos mais recentes: estádios padrão-Fifa (pagos com o nosso suor) e escolas padrão-Etiópia; enquanto isso, agentes políticos e entidades classistas defendendo a venenosa PEC da impunidade (PEC 37), vil atentado à cidadania... violência descontrolada nas ruas e nas escolas públicas, enquanto deputados perdem tempo em manobras para diluir as penas dos mensaleiros e para introduzir imorais reformas na Lei da Ficha Limpa... é melhor parar por aqui.

Naquela ocasião, há dois anos, eu perguntava a você que me lê: somos o povo borra-botas?


E eu mesmo respondia: Definitivamente não! Hoje, muito antes do que todos imaginavam, estamos podendo confirmar com nossos próprios olhos. Nossos eleitos ignoram as causas das impressionantes manifestações populares. Seu costumeiro distanciamento, seu descompromisso e desprezo para com os cidadãos em geral, agora os deixam atordoados. Esses mesmos eleitos, de ontem de de hoje, causaram a desmoralização do que existe de mais sagrado em um Estado de direito democrático: suas próprias instituições políticas. Agora estão assustados e preocupados, fazendo reuniões sigilosas aqui e acolá, tentando adivinhar o próximo passo!


Aqui em Bauru não é diferente... parece que vivemos em plena era medieval onde, de um lado, temos vereador dito progressista votando contra a lei da ficha limpa municipal e de outro, prefeito que ignora solenemente a lei federal da transparência, como se fosse faculdade dele obedecê-la ou desprezá-la.

Lembrem-se! É graças a gente como vocês que as instituições políticas brasileiras caíram em desgraça e descrédito. Dos partidos, centrais sindicais e entidades estudantis cooptadas por esses mesmos partidos, até as câmaras legislativas... todos infelizmente, estão sumariamente banidos das últimas manifestações populares. 
Que vergonha devem estar sentindo! (ou não?) E que inveja talvez estejam sentindo, não é mesmo?... está acontecendo a maior das festas lá fora e vocês não foram convidados! Lamento informá-los, perderam o bonde da história. Para quem sabe o valor de um partido político, ou sindicato para o regime democrático, isso não é motivo para festejo, mas motivo de pesar.

Brevemente surgirão em cena os “profetas do passado”, a traçar um “diagnóstico” pseudo-científico de causas complexas daquilo que estão vendo, mas não entendendo.

Quando escrevi, há dois anos atrás, lembrava que em meio ao mar de lama, a boa notícia era que ciência da antropologia nos ensinava ser a cultura algo dinâmico, sempre se modifica, em diversos sentidos, de forma aleatória ou intencional, lenta ou rapidamente. Só não pensávamos que tudo se precipitaria tão rapidamente.

Todos que trabalhamos séria e gratuitamente em ONGs, em prol de um despertar para o exercício consciente da cidadania, que plantamos sementes de cidadania diariamente, estamos ao mesmo tempo contentes, surpresos e apreensivos, pois ninguém está habilitado a decifrar o porvir, os possíveis e também os improváveis desdobramentos. 
Este grande movimento ainda precisará estabelecer uma pauta perene de reivindicações, para não perder seu vigor e capacidade de mobilização. Precisamos aproveitar esse momento para fortalecer as instituições democráticas, não para enfraquecê-las.

Hoje digo: Parabéns para você que se levantou do sofá! Enquanto os cães velhos latiam sentados, vocês mostraram que não são o povo borra-botas! Desprezaram os anátemas da mídia de massa (que por ora espertamente mudou seu discurso). A todos que deram o primeiro passo em direção ao exercício pleno da cidadania, nota dez! E a nota zero vai para o vandalismo acéfalo e irracional, que nada acrescenta, nada soma, apenas subtrai e desmoraliza.

O autor é professor de filosofia e antropologia, bem como membro da BATRA – Bauru Transparente

publicado no Jornal da Cidade (Bauru) em 25/06/13



* artigo "Somos o Povo borra-botas?" publicado em 26/07/2011, disponível no endereço http://www.jcnet.com.br/editorias_noticias.php?codigo=212291
 

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