sábado, 28 de maio de 2016

Professor e pesquisador?


Professor e pesquisador? Ao mesmo tempo?

Wellington Anselmo Martins*

Essas são atividades que, facilmente, se mostram diferentes. Ensinar e pesquisar. Mas, muitas vezes por imposição, elas caminham juntas.

Ser professor depende de muitos fatores, depende muito de saber se relacionar bem com os alunos, depende de ter uma inteligência interpessoal bem desenvolvida.

Professores carismáticos, abertos e extrovertidos tendem a ter grande êxito na carreira. Costumam ser bons oradores e, além disso, costumam também ser bons “dialogadores” (conseguem mediar debates em sala de aula e valorizar, sem esmorecer, as opiniões mais simples que os alunos costumam sugerir).

Por outro lado, ser pesquisador demanda um conjunto de habilidades e competências diferente. O pesquisador, necessariamente, precisa amar a solidão. Pois grande parte da reflexão e escrita das pesquisas se dá de modo individual, sozinho. O pesquisador, por isso, precisa que sua inteligência intrapessoal esteja mais afiada do que nunca.


Bons pesquisadores costumam ser também bons escritores. São autores de muitos textos, artigos científicos, teses, livros etc. E a maior parte dessa produção é fruto de uma grande introspecção, de um mergulhar em si mesmo.

Ou seja, o professor é um especialista em lidar com pessoas. O pesquisador, um especialista em lidar com ideias.

No entanto, apesar de perfis tão diferentes, a universidade de modo geral impõe um programa de trabalho dinâmico, que exige que os seus pesquisadores sejam também professores, e vice-versa.

Tais universidades pedem (pedem não, obrigam) por vezes que o profissional seja, por exemplo, um pesquisador durante o período da manhã, corrigindo TCCs de alunos, teses de doutorando e, às vezes, escrevendo seus próprios artigos científicos, e já à tarde ou à noite pedem que esse mesmo profissional atue então como professor, lecionando para salas de aula cheias, palestrando para plateias diversisifcadas, mediando debates e conflitos entre os alunos etc.

Isto é, às vezes em um único dia, esse profissional precisa lidar com competências tão opostas como a introspecção e a alteridade. O mergulhar em si mesmo, a individualidade, e o entregar-se ao grupo, a sociabilidade.

Mas a situação se agrava ainda mais quando esse profissional faz parte de uma universidade que defende o paradigma de que o bom professor é, na verdade, um bom animador de auditório, que não só dá aula, mas ainda entretém os seus alunos com dinâmicas de grupo, informações inusitadas e um jeito descontraído de se comunicar.

E, de outro lado, crê no paradigma de que o bom pesquisador é, na verdade, aquele que produz textos em grande quantidade, que consegue ao mesmo tempo corrigir uma dissertação de mestrado que trate do conceito de “indústria cultural” enquanto produz um texto próprio, para um novo livro, tratando da “semiótica peirciana”...

O jargão empresarial costuma chamar de job rotation a alternância de funções pela qual se faz um empregado passar dentro de uma mesma empresa para que, assim, ele possa amadurecer e ter um conhecimento mais completo sobre todo o processo no qual está inserido.

No entanto, nas universidades não se trata de job rotation o que é feito com os professores e pesquisadores. Não se trata de um treinamento. Atuar nessas duas frentes diferentes é, na verdade, o dia a dia comum desses profissionais. Ou seja, cotidianamente eles ocupam funções diversas, que exigem perfis diversos mesmo.

E tudo isso, claro, tem efeitos sobre a qualidade do trabalho desses profissionais. Alguns profissionais do ensino superior optam por priorizar a pesquisa e, por isso, publicam excelentes produções, mas, ao mesmo tempo, quando estão em sala de aula, se mostram professores medianos, visivelmente inseguros ou indiferentes no relacionamento com os alunos.

Outros profissionais, porém, parecem optar por priorizar o ensino. São esses os que podem se tornar grandes palestrantes, conceder entrevistas memoráveis e, não poucas vezes, envolverem-se com a política, dada a sua facilidade de comunicação e relacionamento humano.

Enfim, com certeza há exceções, de grandes professores que, ao mesmo tempo, são cientistas inovadores. Mas são exceções. Pois via de regra o que é fácil enxergar nas universidades são profissionais sobrecarregados, que raramente conseguem equilibrar bem a introspecção da pesquisa de vanguarda com a alteridade necessária para a dinâmica de sala de aula.

Não seria o caso, então, de repensar esse modelo? E criticar mais abertamente esse acúmulo de funções tão distintas? E, quem sabe, valorizar e aprimorar os profissionais que têm um perfil maior para o ensino e, igualmente, dar mais espaço e meios para que se desenvolvam até o seu melhor os profissionais que têm um perfil mais diretamente voltado para a produção científica?

* Graduado em Filosofia (USC), mestrando em Comunicação (UNESP).

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