O Show de Truman - O Show da Vida
-O lado sarcástico e manipulador dos BBBs-
'Conhecendo' o lado de dentro e o lado de fora da "Casa Mais Vigiada..."
O filme começa no dia 10.909 da vida do personagem Truman e alguns "flashbacks" explicam um pouco da história do protagonista e porque ele vive do jeito que vive...
Então, logo entendemos que o protagonista é a estrela de um programa de TV no estilo reality show, mas, com um detalhe sórdido: ele não tem conhecimento de que sua vida é um roteiro escrito e manipulado em um estúdio de TV.
Na trama, Truman Burbank (Jim Carrey) é um vendedor de seguros casado (Laura Linney) que, aos poucos, começa a notar que algumas coisas ao seu redor não fazem muito sentido. Ele começa a estranhar sua cidade, seus supostos amigos e até sua mulher.
No enredo, aconteceu que o idealizador do programa conseguiu “adotar” um bebê de uma gestação indesejada e a criança passou a ser tutelada por uma empresa, que a transformou em uma inédita e questionável experiência lucrativa.
Sim! Truman é, sem saber disso, comprado desde antes de nascer, para ser usado como "animador de auditório" de um programa de entretenimento. Por trás de uma vida aparentemente perfeita, em uma cidade ideal que está ali "para fazê-lo feliz", na verdade, todos estão apenas interpretando papéis e ajudando o diretor do programa e seus investidores a ganhar muito dinheiro.
A expectativa comum nos reality shows é a mesma de qualquer filme: o espectador precisa se "identificar" com o protagonista e melhor ainda se isso acontecer também com os demais personagens coadjuvantes. Ao assistir O Show de Truman, percebemos que todos estão conectados emocionalmente ao personagem principal e "torcem por ele", assim como no nosso cotidiano, pessoas “assistem” às outras, cobram determinadas posturas dela, esperam que vençam provas, que sejam corajosos, que sejam fiéis, que se vinguem, que sejam competitivos, mas compreensivos, que sejam fortes e vencedores, mas que também sejam sensíveis, complacentes, racionais, mas emocionais, etc...
Semiótica e Metalinguagem
Sim. O Show de Truman acaba se mostrando uma excelente leitura semiótica de nossa sociedade, uma crítica inteligente de como nossas vidas são acompanhadas pelas distintas instituições sociais, que acompanham nosso progresso, nossa evolução, como nos premiam ou nos castigam, conforme atendamos ou não as suas expectativas.
Desde que foi lançado, O Show de Truman tornou-se fonte de inúmeras reflexões sociológicas, antropológicas e filosóficas.
Em sua metalinguagem, obteve formidável sucesso em exibir "um show exibindo um show e criticando o show". E ainda com o privilégio de contar com a excepcional trilha sonora de ninguém menos que Burkhard Dallwitz e Philip Glass!!
Por que aceitamos a realidade ao nosso redor?
Mas... por que Truman simplesmente “não se rebela contra sua liberdade fictícia e não abandona logo o enredo”?
Christof, o idealizador do programa, numa entrevista, sentencia: “aceitamos a realidade que nos é apresentada”.
E não é isso que geralmente acontece em nosso dia a dia, quase sempre e quase com todas as pessoas no mundo todo?
Essa "comédia dramática" por fim se revela uma severa crítica de vários aspectos importantes do comportamento social pós-moderno que a maioria simplesmente considera "normal" e aceitável.
Abordando várias questões filosóficas como a ética, o direito à liberdade, a existência ou não do livre-arbítrio, dentre outros, de forma inteligente e sarcástica, sutilmente acaba fazendo também a crítica daquilo que nossa sociedade considera "entretenimento" e do papel da mídia de massa.
Faz-nos refletir sobre como ela (a mídia) nos manipula, assim como manipulou o protagonista durante os 30 anos de sua vida... e não só a vida dele, mas também a vida de todos os demais coadjuvantes da trama e, incluindo os próprios 'telespectadores' que perdiam horas preciosas de sua vida, se entretendo com a vida falsa de outra pessoa.
É verdade que "telespectadores" da maioria dos programas de televisão raramente apresentam bom senso. Então, não é de se estranhar que não se rebelassem contra o modo como a vida de Truman era manipulada de forma cruel e antiética.
Sabemos que reality shows são cada vez mais comuns. Tais "espetáculos" são fruto de uma mídia de massa que é, e sempre foi, essencialmente sensacionalista e capitalista. "Vale tudo" para atingir seu 'sacrossanto' objetivo: altos índices de audiência e lucro, muito lucro.
Para tanto, a mídia se apropria da engenharia social, pois precisa manipular, em primeiro lugar, VOCÊ, telespectador! Em seguida ou quase ao mesmo tempo, manipulará e corromperá os personagens da trama, a ponto de apresentar-lhe um "espetáculo" o mais simplório possível, ao mesmo tempo visceral, pueril e emocional", instigando os instintos mais primitivos do animal humanoide, tentando farejar aquilo que você “deseja assistir”:
O que é vai lhe manter conectado, horas e horas na frente de uma tela?
Conflito alheio, competições, intriga, jogos psicológicos, alianças e traições, tensão, antagonismo, curiosidade da vida alheia, uma miríade de fofocas e futilidades infantilizantes e bestializantes... é disso que se trata...
Trazendo toda essa crítica para o nosso dia a dia: Ao mesmo tempo em que os diretores do programa manipulam protagonistas e antagonistas enjaulados na "Casa Mais Vigiada..." o sistema se retroalimenta... quanto mais manipulados os personagens são, quanto mais conflitos artificiais são fabricados, mais o público - também manipulado - aplaude! E mais as empresas lucram...
E é assim que a engrenagem continua girando... que nós nos alimentamos dela e que ela se alimenta de nós.
Ficha técnica:
- Nome: O Show de Truman: O Show da Vida (The Truman Show) — EUA, 1998
- Gênero: Comédia dramática
- Direção: Peter Weir
- Roteiro: Andrew Niccol
- Elenco: Jim Carrey, Ed Harris, Laura Linney, Noah Emmerich, Natascha McElhone, Holland Taylor, Brian Delate, Blair Slater, Peter Krause, Heidi Schanz, Ron Taylor
- Duração: 103 min.


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