sábado, 14 de setembro de 2013

Iba Mendes: O movimento sanitário e a eugenia

Iba Mendes: O movimento sanitário e a eugenia: “Munford (1998) relata que, nas cidades, até o século XIX, existia um “certo equilíbrio de atividades” e que, com a mudança no modo de prod...



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“Munford (1998) relata que, nas cidades, até o século XIX, existia um “certo equilíbrio de atividades” e que, com a mudança no modo de produção, a população cresceu espantosamente rápido, modificando as condições espaciais e o comportamento urbano. Segundo Paul Singer, “As condições em que a proletarização e urbanização se deram foram extremamente adversas à saúde” (Singer, 1988, p. 20).

A pouca oferta habitacional e os baixos salários forçavam numerosos grupos de pessoas a ocupar residências coletivas próximas às indústrias, cujas instalações, inadequadas e insuficientes às necessidades, favoreciam a proliferação de sujeira e doenças. Tais locais, considerados como deturpadores do caráter pela mistura entre sexos, idades e “índoles”, eram repudiados, assim como seus moradores. A falta e higiene reinante era vista como prejudicial à economia e produtividade, pois repercutia no rendimento da mão-de-obra, nas mortes prematuras e nos gastos médicos (Correia, 2004).

No que se refere à residência, não existia, para grande número de trabalhadores, nenhuma escolha. Durante o século XIX, repetidas vezes eles se viram compelidos a viver em distritos urbanos superpovoados porque seus empregos eram, tantas vezes, de natureza casual, que eles tinham de estar no lugar certo, ou perderiam a oportunidade de ganhar a ninharia necessária à subsistência” (Rosen, 1994, p. 158).
 
Apesar de as indústrias precisarem da mão-de-obra, a permanência dos trabalhadores nas cidades representava ameaça à salubridade e à ordem burguesa. Melhorar os salários e as instalações industriais existentes podia significar queda na lucratividade. Algumas ações, buscando preservar a força produtiva, surgiram individualmente, mas contrariavam o sistema predominante.

O empresário que pagasse mais que seus competidores pela força de trabalho teria custos mais elevados de produção e, portanto, menos lucros, o que acabaria determinando mais cedo ou mais tarde sua expulsão do mercado” (Singer, 1988, p. 21).

Existia uma grande distância entre a condição de vida das diferentes classes sociais. Os mais afortunados aproveitavam os avanços dos meios de transporte e se mudavam para regiões melhores, restando aos pobres as apinhadas regiões próximas às indústrias e aos centros comerciais (Rosen, 1994).

Hochman (1998) relata que a interdependência promovida na sociedade urbana e industrial aumentou as dimensões dos problemas coletivos, até que o “encontro entre a consciência e o interesse” das elites vislumbrou a necessidade de legitimar a organização do Estado como:

“(...) o resultado da necessidade de regulação das externalidades negativas e da produção de bens públicos e das oportunidades advindas da coletivização dos cuidados com a saúde, da educação e da manutenção de renda” (Hochman, 1998, p. 29).

O fortalecimento do Estado, como instituição, ampliou sua esfera de ação. O seu poder era baseado no sistema econômico e, conseqüentemente, no produtivo, no qual os problemas de saúde interferiam diretamente. Sua ação sobre a saúde da população passou a significar manutenção do consumo e da produção de bens (Donnangelo, 1976). A visão da saúde como bem público se relaciona, a partir de então, com a formação de uma “comunidade nacional”, onde:

As políticas de proteção social emergem de uma articulação entre consciência social das elites e seus interesses materiais a partir de oportunidades por elas vislumbradas com a coletivização do bem estar”(Hochman, 1998, p.15).

Visando à manutenção da ordem urbana, as soluções aos problemas de saúde se configuraram como ações policiais, resultando em vigília e punição às infrações (Donnangelo, 1976; Telarol i Júnior, 1996). Com as epidemias, diferentes tipos de controle surgiram sobre a vida dos doentes e, conseqüentemente, sobre as cidades.

A experiência das epidemias de cólera do século XIX, na Europa e nos Estados Unidos, que atingiram a ricos e pobres, e disseminaram-se independente de fronteiras – cidades, regiões, países – explicitou para as elites os problemas da interdependência social e a necessidade de criação de organizações e políticas permanentes, amplas, coletivas, compulsórias e supralocais, com funções preventivas, para combater os riscos da infecção e do contágio em massa” (Hochman, 1998, p.28).

A teoria miasmática – que defendia as condições atmosféricas como causadoras de doenças – e a contagionista – que considerava as epidemias como resultado do contato com os doentes – somadas aos avanços técnicos e à descoberta dos microorganismos patogênicos, definiram, no século XIX, os pensamentos que passariam a moldar as cidades.

Por não se conhecerem profundamente as causas das doenças, as ações se dividiam somente entre o isolamento de doentes em hospitais (evitando-se o contágio) ou a fiscalização de produtos, construções e espaços públicos e a estruturação urbana (evitando-se a transmissão pelo meio) (Rosen, 1994). Descobrindo-se o poder da limpeza sobre as doenças, médicos e engenheiros atuaram conjuntamente na execução de obras de higienização urbana (Campos, 2002). Dessa relação surgiu a engenharia sanitária, resultando nas grandes ações sanitárias urbanas, que tinham a sujeira como inimiga da saúde, logo também os espaços dos pobres e miseráveis.

A crença no contágio e nos miasmas, como propagadores das doenças, fortaleceu a representatividade do meio na manutenção da vida humana mediante a higiene pública. As habitações dos pobres eram consideradas ameaçadoras para a saúde de seus ocupantes e das cidades. Tais instalações eram temidas por serem espaços de aglomeração de pessoas tidas como potencialmente contaminadas, e estarem localizadas em regiões importantes, o que favorecia a difusão de moléstias. Tal situação resultava em maior estigmatização da pobreza e das doenças, pois representava uma ameaçava à segurança dos abastados e de suas fontes de lucro. Pobreza e doença, por serem os avessos da ordem produtiva burguesa, eram rejeitadas (Rago, 1997).

O entendimento das epidemias como resultado da espacialização da pobreza e como ameaça ao sistema produtivo, à integridade burguesa e ao progresso, direcionou as atenções do Estado, e de toda classe “letrada”, sobre a condição de vida e moradia operária. Entendia-se que o ambiente conturbado e sujo dos cortiços, casas de aluguel e demais abrigos multifamiliares deturpava os indivíduos. Logo, a solução se encontrava na modificação do espaço e da vida das classes pobres, já que interesses econômicos e sociais se opunham a uma igualdade maior de classes pela melhora na remuneração e nas condições de trabalho.

A idealização burguesa de uma conduta operária, embasada no aprendizado, na importância do trabalho e da moralidade, foi imposta pela disciplina e pela medicalização (Foucault, 2003). A importância da transformação do meio, para a solução de problemas de saúde pública, fez com que a medicina e a engenharia se configurassem como saberes higiênicos e tivessem seus domínios de ação expandidos. A crescente aversão à imagem deturpadora da cidade fortalece os valores campestres como ideais na composição de um homem “naturalmente bom e saudável” (Tomas, 1988). Novas soluções construtivas eliminam os “perigos” da natureza, desmistificando ar, água e solo como contribuintes às doenças.

Margareth Rago (1997) relata que os hospitais, prisões e demais instalações comunitárias se tornaram “laboratórios” para a higiene dos corpos e de comportamentos. O que se descobria era aplicado na ordenação do ambiente urbano, buscando-se um implemento para a produtividade e a saúde.

Segundo Munford (1998, p. 483-7), o século XX inicia-se num ambiente regido por ciências ordenadoras do homem e de seu espaço. Concretiza, em larga escala, os preceitos higiênicos nas edificações e nas estruturas urbanas, pois o século anterior mitificara as cidades industriais como a imagem do que “se deveria evitar”, do “mais degradado ambiente urbano”, onde a ocupação desregrada resultara em “vasta improvisação urbana”, em virtude da rapidez e da competitividade que regiam a nova condição industrial em destruidora expansão.

Apesar de as habitações (pelo seu impacto direto sobre o homem) terem sido os elementos focalizados pelos engenheiros e médicos sanitaristas (habilitações construídas pela busca de soluções espaciais para problemas de saúde pública), as transformações da paisagem natural ocorreram na “correção” de águas, ar, luz e da própria condição geográfica. O poder tecnológico adquirido, com a ciência industrial, buscando controlar a natureza em prol da produtividade, criou instrumentos como pontes, ductos, janelas, vidros, lâmpadas, aterros, entre outros elementos, que definiriam a paisagem moderna.

No Brasil, as primeiras décadas republicanas foram marcadas pela inquietação diante das condições de higiene do país, entendidas como comprometedoras para a integridade da nação brasileira e de seu progresso. Mota (2003) relata que, para muitos, o Brasil era um país onde “o solo era pobre, o clima inóspito, a natureza traiçoeira [uma terra onde] o homem padecia, mergulhado na indolência e na tristeza. Nada produzira e nada produziria” (Mota, 2003, p.19). Tal visão contrastava com a daqueles que vislumbravam no país uma “nova Canaã”. O autor ainda relata que tal “ambivalência” resultava da busca de uma compreensão e definição, por parte das elites, das mazelas brasileiras que deveriam ser sanadas para que o país se enquadrasse nos moldes capitalistas vigentes.

a figura monstruosa do pobre doente, sujo, semimoralizado e racionalmente incompleto foi amplamente divulgada para justificar uma estratégia que desejava levá-los do conforto selvagem ao conforto civilizado” (Bresciani, apud Virgílio da Silva, 2005, p. 71).

Naquele momento, a medicina assumia uma posição distinta em conseqüência da existência de normas de condutas entre os médicos. Acreditava-se que o médico possuía um dom sobrenatural que o distinguia dos outros homens. Dessa forma, as políticas públicas de saúde se instauram dentro das comunidades, dominando-as em prol do combate às doenças, incorporando também a estatística, a geografia, a demografia e a história à lógica médica (Mota, 2003).

A elite republicana no Brasil tinha os cientistas e médicos como verdadeiros heróis nacionais, apoiava e, quase nunca, contestava seus atos. Dava-se o crédito para que eles pudessem praticar suas convicções. As ações eram vistas como provenientes de seres iluminados pela sabedoria divina, de salvadores da humanidade.

Reconheço e não canso de proclamar a alta e imensurável função social do médico. Platão disse que a humanidade será feliz quando os filósofos forem reis ou quando os reis forem filósofos. Na minha opinião dever-se-ia dizer que a humanidade será feliz no dia em que os médicos forem governantes ou que os governantes forem médicos” (Kehl, apud Santos 2005, p.01).

Acreditava-se que o resgate da saúde do povo brasileiro, o aumento do seu vigor físico e da sua capacidade produtiva resultaria na consciência e no respeito aos deveres e direitos e no reconhecimento das grandes ações médicas. As publicações médicas da época vislumbravam um futuro saneado e promissor, apostando na inteligência e pertinência das campanhas saneadoras.

Assim, avaliavam que o reconhecimento do cidadão comum era esperado quando todo o povo, finalmente educado, pudesse compreender que tantos esforços médicos visavam, como única recompensa, ao dever de redescobrir o Brasil” (Matos, 2003, p.21).

O saneamento se estabeleceu buscando resolver algumas das ambigüidades que entravavam o desenvolvimento, inclusive a formação de um povo. Entendia-se que sanear seria também conhecer e rever a educação, saúde, moradia, costumes e cultura da população. “Eis por que os médicos da época aceitariam a missão de restaurar a sociedade avariada: só eles poderiam desvendar – e combater – as causas que tornavam o progresso nacional incerto” (Matos, 2003, p.20).

Os médicos assumem a “missão regeneradora nacional”, passando a ocupar cargos e a desempenhar tarefas distintas à medicina, que somente eram confiadas aos homens superiores. As ações de saneamento inicialmente resultaram da associação do espaço à medicina e se deveram à crença nos miasmas como coadjuvantes no adoecimento. Entretanto, a partir da medicina microbiana do século XIX, o foco das causas das doenças recaiu sobre o indivíduo.

As crenças sobre a transmissão das doenças, embasavam-se tanto no contágio, no qual os agentes da doença passavam de uma pessoa doente para outra sã; como na infecção, em que existia uma etapa intermediária da transmissão que envolvia o meio. Nesse contexto o indivíduo doente passa a ser controlado, pois assume maior importância no processo de transmissão.

Buscando diretrizes de ação sobre as epidemias e entendendo o homem como veículo de sua transmissão, utiliza-se o levantamento estatístico e geográfico para identificação dos focos das doenças. Todos os dados levantados remetiam às regiões pobres e populosas. Entretanto, as ações não buscavam reverter as condições de pobreza, pois isto repercutiria nos aspectos econômicos e de trabalho que favoreciam a burguesia. Condenavam-se, assim, suas moradias e hábitos, buscando-se neles justificativas para as más condições higiênicas e o atraso nacional.

A condenação da moral associada aos preceitos sanitários resultava em ações autoritárias e disciplinadoras, assim como na segregação dos pobres em prol da salubridade urbana. A instituição de hábitos e valores deslegitimou costumes, tradições e conhecimentos, desintegrando “identidades culturais” de povos que formavam a classe pobre. Justificavam-se, pela sujeira e má índole, as ações de exclusão desses grupos, das áreas urbanas valorizadas.

Segundo Antunes (1999, p. 275), “[...] a medicina passava a submeter-se às demandas conjunturais da coletividade, repercutindo, em especial, na dimensão moral da vida social”. Ao se humanizar como ciência, conseqüentemente, a medicina assume uma dimensão de controle de conduta e moralidade. Silva (2005) aponta, ainda, sobre a época republicana, uma inclinação médica para as questões envolvendo a psiquiatria, a criminologia, a hereditariedade de distúrbios e malformações físicas, o que evidenciava ideologias eugenistas.

A eugenia foi um conceito formulado pelo biômetra e antropometrista Francis Galton, em 1883, que, definindo a “ciência do melhoramento biológico do tipo humano” (Castañeda, 2003, p.2), pregava a dependência do progresso humano diante da herança de características físicas, mentais e morais dos indivíduos. Galton acreditava no “determinismo biológico”, isto é, o indivíduo tinha seu caráter definido no nascimento, não havendo margens para a melhora de degenerados: somente a suspensão de sua procriação quebraria o ciclo hereditário de características negativas. A eugenia priorizava a raça branca e defendia sua manutenção mediante ações de controle de miscigenação (Castañeda, 2003; Silva, 2003; Mota, 2003; Santos, 2005).

A crença, proveniente dos conceitos miasmáticos, de que o meio influenciava as condições de saúde e comportamento construiu, juntamente com a eugenia, a idéia de que uma raça poderia ter suas características positivas otimizadas pelo controle das condições ambientais e dos costumes dos indivíduos, assim como pela miscigenação com tipos superiores e por restrições à procriação dos inferiores. Os Estados e sociedades interessados numa transformação racial passaram a instituir leis e normas para o controle das imigrações, dos casamentos e para a “assexualização e esterilização” de indesejáveis (Castañeda, 2003; Mota, 2003).

Segundo Silva (2005), Galton acreditava que as melhores espécies da raça deveriam ser tratadas de forma que procriassem, sendo-lhes fornecidas melhores condições de vida e moradia para que tivessem condições de manter e expandir suas qualidades. “Isso significa claramente que se abandone a idéia de investimento em habitações populares, por exemplo, que se constituiriam um esforço pouco lucrativo para a melhoria da raça” (Silva, 2005, p.97).

A população brasileira, miscigenada desde a colonização, era vista como destinada ao fracasso e atraso, visto que cientistas e demais eruditos entendiam que as condições geográficas e climáticas do país desfavoreciam o desenvolvimento físico, psíquico e social. Uma sociedade mista, sem qualidades e com grande número de miseráveis deveria ser transformada, caso quisesse galgar posições comerciais e econômicas entre as nações desenvolvidas. Mota (2005) acredita que as ações sanitárias brasileiras foram amplamente desenvolvidas segundo critérios eugenistas e que as segregações resultantes buscavam eliminar os indesejáveis ao progresso e ao futuro da nação brasileira.

Os grupos intelectuais identificados com as idéias eugênicas planejavam uma ordem social perfeita, isto é, projetavam seus símbolos e representações burguesas em busca de uma nação sem conflitos sociais (Santos, 2005, p. 08).

As teorias eugenistas de Galton foram introduzidas e difundidas no Brasil pelo médico paulista Renato Ferraz Kehl, por meio de conferências e publicações. Segundo Santos (2005) ele exerceu o cargo de “inspetor sanitário rural do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), no qual organizou o Serviço de Educação Sanitária ligado à Inspetoria da Lepra e das Doenças Venéreas” (Santos, 2005, p. 05).

A idéia de que a nação não se desenvolveria por si só e de que dependeria de intervenções públicas para se organizar, fortaleceu a presença do Estado e de suas ideologias. Definiam-se a educação e a saúde como meios de transformação, centralizando, para melhor eficiência das propostas, esses serviços (Santos, 2005).

O projeto de construção nacional poderia assim ser resumido: a politicalha republicana deveria ser substituída por homens capazes, tornando-se uma política científica, e não fruto de paixão ou interesse. Teríamos então uma administração competente, pois de acordo com os princípios científicos. As políticas públicas deveriam tornar-se um procedimento de laboratório” (Santos, 2005, p. 08).

A abolição, sem planejamento social, da escravatura no Brasil enviou um contingente populacional de negros libertos, sem trabalho e sem dinheiro, para as cidades, o que aumentou, consideravelmente, o número de miseráveis, ampliando a associação entre a raça não branca e os problemas sociais. A elite, cada vez mais, acreditava que somente o branqueamento poderia salvar o país.

Aqueles que negavam a incapacidade nativa tropical acreditavam que a educação e o saneamento beneficiariam as futuras gerações, implementando a raça brasileira. Teses científicas surgiam garantindo que o desenvolvimento econômico e social promoveria a evolução racial e que, para tanto, seriam cada vez mais valorizados os tipos mais produtivos. Diversos autores acreditam que se formava assim uma eugenia tipicamente brasileira, que buscava, pela miscigenação, soluções para os conceitos estrangeiros sobre a incapacidade tropical.

O Brasil adentra o século XX buscando uma identidade nacional que garantisse ao país uma imagem de progresso. A busca do desenvolvimento econômico e social abria portas para a ciência e, conseqüentemente, para ideologias de higiene racial.

O discurso eugenista (...) foi se consolidando nos primeiros anos de República, através de seu caráter progressista, que estava de acordo com a influência positivista da própria Proclamação da República. A Eugenia se tornou um amálgama ideológico num espaço de conflito, contextualizado pelo fracionamento dos interesses econômicos entre setores agrários alijados do poder pela burguesia cafeeira e de recém- surgidos industriais, além de uma classe média multifacetada e de reivindicações operárias constantes” (Couto, 1999, apud Silva, 2005, p. 99).

Silva (2005) afirma que o Brasil foi o primeiro país sul-americano a desenvolver e organizar um movimento eugenista e que São Paulo saiu à frente criando a Sociedade Eugênica de São Paulo.

Alguns intelectuais sanitaristas destacaram-se neste cenário, pois consideravam que o ‘problema vital’, como destacou Monteiro Lobato, que dominava a sociedade brasileira, nada tinha a ver com o chamado determinismo biológico. Para estes, a explicação era médica e a solução era eugênica e educativa. Tratava-se de aprimorar a raça nacional por meio da ‘higienização’ das células reprodutoras” (Santos, 2005, p.09).

As ações eugenistas se dividiam em: preventivas, controlando pelo saneamento os aspectos desfavoráveis à manutenção das boas raças; positivistas, incentivando e regulamentando a procriação dos melhores; e negativista, evitando a procriação dos inferiores. As ações preventivas e positivistas favoreceram investimentos para o melhoramento de regiões cujos grupos populacionais eram vistos como hereditariamente favorecidos, acreditando-se que boas estruturas físicas desenvolveriam as melhores características latentes. Incentivava-se, para a perpetuação dos melhores gêneros, o casamento entre semelhantes. Já as ações negativistas eram restritivas à procriação e existência de grupos tidos como medíocres e deficientes. Para tanto, instituía-se a segregação e esterilização de tais indivíduos.

A esterilização dá resultados na redução dos degenerados; estes resultados, porém, não são imediatos e só se farão sentir após muitos anos de uma execução perfeita e permanente (...) a esterilização é um auxiliar poderoso da redução dos degenerados, mas isoladamente não resolve o problema da eugenização da espécie (...). Em suma, para a melhora física, moral e intelectual dos nossos semelhantes, é necessário lançar mão da esterilização, sem prescindir, porém, da pratica dos demais preceitos ditados pela eugenia positiva, preventiva e negativa” (Kehl, apud Santos, 2005, p. 08).

A seleção racial defendida pelos eugenistas pregava uma padronização do comportamento e dos indivíduos segundo idealizações, “estabelecendo o certo e o errado, o que se devia e o que não se devia fazer no âmbito da sociedade para se chegar ao patamar mínimo de civilização” (Mattos e Fornazari, 2005, p. 51-2). Como resultado da definição dos tipos ideais, surgiram os elementos considerados nocivos à sociedade e que deveriam ser contidos por “medidas de caráter restritivo”.

Buscando assegurar a ordem e a qualidade populacional, diversas instituições de reclusão são construídas no início do século XX, seguindo diretrizes de isolamento dos degenerados e dos propagadores de más características, além de pesquisas para identificação e modificação de tipos ruins. Hospícios, cadeias, instituições para internamento de menores e de doentes são disseminados e desenvolvidos buscando soluções para o entendimento, controle e eliminação das ameaças ao futuro da nação brasileira. “A segregação em asilos, por sua vez, representaria um método de isolamento dos que eram declarados incapazes de ter ‘descendência normal’” (Mota, 2003, p. 44).”

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É isso!
Fonte:
Ana Paula Silva da Costa: “ASILOS COLÔNIAS PAULISTAS: Análise de um modelo espacial de confinamento”. (Dissertação apresentada à Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo – Área: Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo.Orientadora: Profa. Dra. Telma de Barros Correia). Universidade de São Paulo - USP. São Carlos, 2008.

Nota:
A imagem inserida no texto não se inclui na referida tese.
As referências bibliográficas de que faz menção o autor estão devidamente catalogadas na citada obra.

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