silvio m. max.
As
afirmações listadas abaixo foram extraídas da vida real. Algumas nas
ruas do interior do Brasil, outras nas cidades grandes, outras em
discursos de políticos. Percepções diversas, vindas de pessoas com
histórias diferentes, mas com um direcionamento em comum: a disseminação
do discurso anti-indígena com argumentos falsos
Texto e fotos por Lilian Brandt*
As 10 mentiras mais contadas sobre os indígenas
Mentira nº 1: Quase não existe mais índio, daqui alguns anos não existirá mais nenhum
Se
as pessoas não sabem muito sobre os indígenas na atualidade, sabem
menos ainda sobre o passado destes povos. Mesmo os pesquisadores não
encontram um consenso, e os números variam muito conforme os critérios
utilizados.
A antropóloga e demógrafa Marta Maria
Azevedo estima que, na época da chegada dos europeus, a população
indígena no Brasil era de 3 milhões de pessoas. Eram mais de 1.000 povos
diferentes, que durante séculos foram exterminados pelos
conquistadores, seja por suas armas de fogo, seja pelas doenças que eles
trouxeram. De acordo com antropóloga, em 1957 havia no Brasil apenas 70
mil indígenas. O crescimento desta população é observado somente a
partir da década de 1980.
Em 1991, quando o IBGE passou
a coletar dados sobre a população indígena brasileira, eles somavam 294
mil pessoas. Em 2000, o Censo revelou um crescimento da população
indígena muito acima da expectativa, passando para 734 mil pessoas. Em
2010, a população indígena continuou crescendo, e o Censo mostrou que
mais de 817 mil brasileiros se autodeclararam indígenas, representando
0,47% da população brasileira. Eles estão distribuídos em 305 etnias e
falam 274 línguas.
Esse aumento populacional jamais
seria possível se fossem considerados apenas fatores demográficos, como a
natalidade e a mortalidade. Esses dados revelam o crescimento do número
de pessoas que passaram a se reconhecer como indígenas e o
“ressurgimento” de grupos indígenas. Isto se dá porque, antes, ser índio
no Brasil significava ser atrasado, inferior, escravizado, catequizado,
ser alvo de discriminação, de chacinas e até mesmo não ser considerado
humano. Diversos povos foram obrigados a abrir mão de suas línguas e de
sua cultura. Agora os povos indígenas voltam a afirmar sua identidade,
talvez porque as circunstâncias estejam mais amigáveis. Ou talvez porque
este grito não suporte mais ser calado.
Tratá-los
simplesmente como “índios” esconde a imensa diversidade cultural e
circunstâncias de vida tão distintas. Mas algo muito mais forte que as
diferenças étnicas propicia a união destes povos: o fato de se sentirem
diferentes de nós.
Temos no Brasil todos os tipos de
extremos: índios que possuem seu território assegurado e índios que
morrem lutando por seu território; índios brancos e índios negros;
índios cristãos e índios pajés; índios isolados e índios urbanos.
Os
povos indígenas isolados são aqueles que não estabeleceram contato
permanente com a população nacional e com o Estado. As informações sobre
eles são transmitidas por outros índios, por moradores da região e por
pesquisadores. A Funai (Fundação Nacional do Índio) tem cerca de 107
registros da presença de índios isolados em toda a Amazônia Legal, dos
quais 26 já foram confirmados e estão sendo monitorados, seja por
imagens de satélite, sobrevoos ou expedições na região. Não se sabe, no
entanto, a quantidade destes povos e indivíduos que vivem
voluntariamente isolados.
Muitos já tiveram alguma
experiência de contato não amistosa com garimpeiros, madeireiros,
grileiros e traficantes próximos à fronteira. Também é provável que
tenham tido ou mantenham contato com populações ribeirinhas,
seringueiros e, principalmente, com algum outro povo indígena.
Os
resultados do contato conosco são trágicos, a começar pelas doenças que
transmitimos, para as quais eles não têm imunidade: sarampo, rubéola,
caxumba, difteria, tétano, hepatite, gripe e outras. Conhecendo esta
realidade, estes povos que vivem em situação de isolamento escolheram
fugir. Isso não significa, no entanto, que eles não tenham notícias de
nossa sociedade. Eles observam rastros, utilizam ferramentas e se
relacionam com outros indígenas que contam as novidades do mundo do
branco.
Em outros tempos, como muitos devem se lembrar,
o órgão governamental indigenista, na época chamado SPI (Serviço de
Proteção aos Índios), deixava presentes como espelhos, panelas e
ferramentas para atrair os indígenas. Hoje a Funai busca garantir que
eles tenham seu território assegurado para transitarem livremente. Mas
as ameaças são muitas e cada vez mais seus territórios são menores.
Os
indígenas que vivem em áreas urbanas somam 324 mil, ou seja, 36% do
total da população indígena, um número que vem crescendo ano após ano
(IBGE, 2010). Há dois motivos recorrentes para que esses índios vivam em
áreas urbanas. Um deles é a migração dos territórios tradicionais em
busca de melhores condições de vida na cidade. O outro é que os limites
das cidades cada vez mais alcançam as fronteiras de seus territórios.
As
pessoas continuam acreditando que a população indígena está sendo
reduzida, mesmo que os números digam o contrário e que eles estejam mais
presentes nos centros urbanos. A desinformação tem uma consequência:
fingimos que os índios estão deixando de existir e gradualmente não
pensamos mais na situação deles. Assim fica mais fácil justificar nenhum
respeito a seus direitos e à sua própria vida.
Mentira nº 2: Os índios estão perdendo sua cultura