Proponho a revolução!
de Flávio Siqueira
Você já sentiu que as peças que estamos usando para construir o quebra cabeças de nossas vidas não se encaixam? Basta o mínimo de atenção para ver que tem muita coisa errada.
Por
exemplo, há poucos dias uma entidade internacional de apoio a programas
de desenvolvimento chamada OXFAM divulgou um relatório desanimador.
Apesar do que os governos anunciam, a concentração de riquezas no mundo
está aumentando.
Segundo
a entidade, em pouco tempo a riqueza acumulada por 1% da população será
superior a tudo o que os 99% restantes possuem. O relatório mostra que,
apesar de produzirmos alimentos suficientes para suprir à necessidade
três vezes superior a demanda de habitantes do nosso planeta, uma em
cada nove pessoas no mundo ainda passa fome. É muita coisa.
Mas
os números são chatos e podem ser contra argumentados como fazem com
habilidade os políticos. Deixando-os de lado, preste atenção em como a
maioria de nós conduz a própria vida. Olhamos com naturalidade um
sistema que chama a casa própria de “sonho”. Não tenho conhecimento de
nenhum animal que precisa de tanto esforço para ter um canto na vida.
Somente o bicho humano é capaz de criar um “mercado imobiliário” tão
voraz, como especialmente o das grandes capitais.
Nos
acostumamos com a desigualdade e a justificamos. Para muitos de nós, os
milhões de homens e mulheres apertados em um ônibus abafado e lotado é
parte da paisagem natural, assim como as famílias que moram na rua, como
os cenários de miséria contrastando com ambientes de luxo. A falta de
educação que inibe o pensamento crítico, que nos transforma em bonecos
do consumo, é aceitável, aderimos ao “cada um por si” sem percebermos
que esse olhar fragmentado é justamente o que viabiliza tamanha
desigualdade.
Não
estou falando sobre socialismo, que não deu certo onde foi testado. O
capitalismo também não. Apesar da prosperidade ostentada por poucos, não
posso me conformar com um sistema em que 1% da população concentra mais
riquezas do que todo o resto. Isso não pode ser encarado como algo que
deu certo.
Enquanto
nos distraímos tentando nos aproximar dos exemplos propagandísticos de
sucesso, fechamos os olhos para a grande maioria que jamais terá o
mínimo.
Há
os que não se incomodam com o ritmo alucinante de trabalho que rouba um
pai da família, a mãe dos filhos, que congestiona as cidades, que
separa as pessoas, que provoca doenças emocionais. Esses encaram o fato
de que a educação, a fé e a política se transformaram em “mercados”
disputando nichos com avidez, em muitos casos sem nenhuma ética, como um
fenômeno absolutamente aceitável. Tudo ganhou preço, tudo virou mercado
e perdeu o valor.
Talvez
nossa maior dificuldade em virar o jogo seja a crença de que nada
podemos fazer. Esse mesmo sistema nos convence de que somos impotentes,
de que o preço do progresso é a desigualdade e tudo o que nos cabe é
lutar, lutar muito, para quem sabe um dia encontrarmos lugar nos vagões
da frente caso não queiramos a mesma morte dos que ficaram para trás.
Fomos convencidos de que não há escolhas, ou aderimos, ou morreremos com nossas “ideologias utópicas”.
Não
estou aqui para propor novos sistemas. Não acredito que simplesmente
mudar um “ismo” por outro seja suficiente para que haja justiça.
Pessoalmente só vejo um caminho: O movimento individual que promove
revoluções em seus micro sistemas.
Em
cada mente que desperta há a implosão de um sistema. Quem vê sai da
bolha e passa a se relacionar com ela a partir de outra perspectiva. Não
estou dizendo que esse indivíduo necessariamente impactará o todo, mas o
que é o todo se não a somatória dos indivíduos? Se cada um de nós se
propuser a repensar o estilo de vida, incluindo nossas prioridades,
nossos sonhos, nossos valores, seremos agentes subversivos onde quer que
estejamos. E tanto faz se a maioria não se importar. Eu me importo e
viverei conforme minha consciência.
Acredito
que o maior mal dos nossos sistemas, sejam eles quais forem, é a
inibição do pensamento. Melhor sentir do que pensar, melhor correr do
que parar e enxergar, melhor entrar no fluxo frenético da maioria
imbecilizada, do que questionar sobre o que estamos fazendo com nossa
própria vida. O resultado disso é a gigantesca desigualdade e nossa
incrível passividade zumbificada diante dela.
Proponho
a revolução! Não as que usam armas, nem as panfletarias com seus
discursos cheios de amargura, proponho que nossa insatisfação seja
alavanca de um reposicionamento de vida. Proponho que deixemos de
esperar tanto dos outros, dos governos, dos empregadores, do Batman, do
Obama ou de Deus e façamos o que dá em nossos mundinhos. Há muito a
fazer em seu mundo!
A
revolução que proponho se concretiza sempre que um indivíduo inverte a
lógica do sistema em si, e reflete naturalmente o novo olhar para o
todo. Se nossa escolha é viver dentro do sistema não precisamos permitir
que o sistema viva em nós.
Até
onde isso pode nos levar não faço a mínima ideia, mas sempre que vejo o
mundo como está, o que me consola é a esperança de que pequenos
movimentos subversivos são possíveis; mentes que não viam agora veem,
gente resignada agora pensa, mundos encurralados por tanta pressão
encontram um caminho que antes de tudo seja reflexo de outro olhar.
Não
é o mundo que precisa mudar, é o nosso olhar. Quando isso acontece, o
mundo, sem escolha, simplesmente acompanha. Se isso deve começar por
alguém, por que não pode ser com a gente?
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