quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Ken Wilber: entrevista com “O Einstein da Consciência”

reproduzo abaixo, a inédita e muito boa entrevista feita com o famoso pesquisador Ken Wilber, criador da chamada "Psicologia Integral". Apelidado de 'Einstein da psicologia moderna', faz uma análise crítica e inteligente das quatro principais correntes da Psicologia contemporânea.

por , (publicada originalmente em seu site: http://papodehomem.com.br/),

agosto de 2010

Nota do editor: se você não conhece Ken Wilber e deseja uma visão genial para mapear e integrar toda a pluralidade de perspectivas que encontra por aí, siga lendo. 

grupo online sobre Ken Wilber.

Percurso para uma visão integral

Ken Wilber é uma figura difícil de definir. Pensador contemporâneo com uma proposta de integrar todo o conhecimento humano, ele trabalha com ciência, filosofia, ética, espiritualidade e arte.
As contribuições wilberianas no campo da psicologia, por exemplo, tiveram tal impacto cultural que a crítica o aclamou como o “Einstein da psicologia moderna”. Com 23 livros traduzidos para mais de 30 idiomas, ele é um dos poucos autores vivos presenteados com suas “Obras completas”, em 9 volumes ao melhor estilo enciclopédico.
Nascido em Oklahoma City, EUA, em 1949, viveu em diversas cidades ao longo de sua vida já que seu pai pertencia à força aérea americana. Assim que completou o segundo grau em Lincoln, Nebrasca, começou o curso de Medicina na universidade de Duke. Logo no primeiro ano de curso perdeu o interesse pela carreira médica e começou a estudar psicologia e filosofia por conta própria. Posteriormente, voltou a Nebraska e completou um mestrado em bioquímica, abandonando em seguida a carreira acadêmica para se dedicar aos estudos e a prática da meditação.

Créditos: Felipe Cherubin.

Até 1998, Wilber era tido como uma figura arredia optando por não lecionar e não aparecer em eventos sociais. Preocupava-se estritamente em escrever e conduzir suas pesquisas. Foi nesse ano que fundou o Integral Institute para fomentar pesquisa, educação e filantropia. O Integral Institute hoje desenvolve um trabalho em 26 áreas do conhecimento humano e conta com mais de 400 pesquisadores.
Posteriormente, criou uma universidade e um centro dedicado à discussão ecumênica, atuando assim por meio de três frentes institucionais. Wilber e a equipe de assessoria política do Integral Institute trabalharam com Al Gore, Clinton, Bush e Tony Blair. Gore e Clinton, por exemplo, declararam publicamente a admiração pela obra wilberiana.
Wilber começou sua trajetória intelectual fazendo um estudo sistemático das escolas de psicologia ocidentais e das tradições de sabedoria orientais, o que deu origem ao seu primeiro livro, O Espectro da Consciência, escrito quando o filósofo tinha 23 anos. A evolução da obra escrita de Wilber é indissociável do amadurecimento do próprio filósofo, marcado por grandes rupturas, tanto teóricas quanto pessoais.

Como integrar Freud e Buda?

“I have one major rule: everybody is right. More specifically, everybody—including me—has some important pieces of the truth, and all of those pieces need to be honored, cherished, and included in a more gracious, spacious, and compassionate embrace.”

Tradução livre: “Eu tenho uma grande regra: todo mundo está certo. Mais especificamente, todo mundo – eu incluso – possui alguns importantes pedaços da verdade, e todos precisam ser honrados, valorizados e incluídos em um abraço gracioso, espaçoso e compassivo.”

Em seus primeiros estudos, Wilber chegou a um impasse. Deparou-se com Freud dizendo que para ser feliz você precisa fortalecer seu ego enquanto Buda ensinava que para ser feliz você deve, metaforicamente, morrer para o seu ego. Ou seja, duas afirmações aparentemente contraditórias. Qualquer pessoa diria que Freud está certo e Buda errado ou vice-versa.
A originalidade de Wilber está na percepção profunda desse impasse. Diante de dois gênios da humanidade, ele não conseguia aceitar que um deles pudesse estar completamente errado. A solução foi afirmar que ambos estão certos, mas parcialmente certos.
Tal insight norteou todo o pensamento wilberiano no sentido de que ninguém erra 100%, todos tem alguma contribuição para dar. Seu esforço intelectual, então, se concentrou na tarefa de como integrar as verdades parciais de quase todos os saberes da humanidade (da física à sociologia) num sistema explicativo, numa matriz que respeite a hierarquia e o senso de proporção de cada proposta.

Link YouTube | Ken Wilber fala sobre espiritualidade e ciência.

A falácia pré-trans: o paraíso está atrás ou à frente?

Wilber divide sua obra em cinco fases. A segunda e terceira fases são marcadas pelo rompimento teórico com concepções românticas em que o filósofo cometeu graves erros de interpretação, o que posteriormente ele chamou de falácia pré-trans, e por um período de isolamento em função do câncer fatal de sua esposa Treya.
Wilber identifica a falácia pré-trans em Freud, que confundiu o transpessoal com o pré-pessoal, e nos entusiastas new age, que muitas identificam traços pré-pessoais e transpessoais, como se sabedoria fosse uma questão de retornar ao mundo tribal ou virar crianças novamente.
Para Freud, o transpessoal, ou seja, a espiritualidade e as tradições religiosas eram todas epifenômenos de estados pré-pessoais, infantis. Carl Jung, no início de seus escritos fez o contrário, os arquétipos que seriam em sua maioria pré-pessoais foram elevados ao status transpessoal. Essa posição junguiana rendeu um comentário inusitado por parte do imortal da academia francesa René Girard. Em seu livro Coisas Ocultas Desde a Fundação do Mundo, o antropólogo assinala com bastante finésse essa inversão junguiana ao tratar da violência humana: “Não é Jung com seus arquétipos cheirando a água de rosas que poderá nos esclarecer sobre isso” (pág 141).
Dentro deste contexto, já desprovido de concepções românticas, Wilber entende que os “bons selvagens” viviam em estado pré-pessoal e não se viam ainda como individualidade, ou seja , não eram tão bons assim. Os povos primitivos destruíam, sim, a natureza, mas com a tecnologia de que eles dispunham a destruição era pouco expressiva. A “pureza” da criança é outro dogma romântico, pois ela ainda está de fato num estágio de pré-pessoalidade, de fusão, que interpretamos, erroneamente, como inocência. A bondade pressupõe o outro e num estágio de pré-pessoalidade você não se vê, muito menos o outro.
Assim, ao invés da visão romântica da recuperação da bondade, estamos avançando em busca da bondade, desde sempre. O desenvolvimento humano, de acordo com Wilber, segue pelos níveis pré-pessoal, pessoal e transpessoal, sendo que as concepções de tipo românticas apropriam-se de níveis pré-pessoais e os elevam ao status de transpessoais (e vice-versa).
A obra Éden: Queda ou Ascensão?, recém lançada no Brasil com tradução de Ari Raysnford, marca a ruptura definitiva com o romantismo psicológico. Wilber utiliza o conceito de dialética do progresso do filósofo alemão Jürgen Habermas e o trabalho do suíço Jean Gebser para desenvolver o arcabouço intelectual dessa nova perspectiva.

O modelo integral: para entender todas as visões da humanidade


Um mapa pra você encaixar quase todas as visões existentes (clique para ampliar)
A partir da quarta fase, reconhece-se um pensamento realmente maduro do filósofo, do qual a obra Psicologia Integral é um paradigma. É nesta fase que Wilber apresenta o Modelo Integral com seus cinco componentes: quadrantes, níveis, linhas, estados e tipos. Os quadrantes representam quatro perspectivas inatas de todos os seres sencientes: intencional (interior do indivíduo), cultural (interior do coletivo), comportamental (exterior do indivíduo) e social (exterior do coletivo).
Esse modelo integral pode ser entendido pela analogia proposta pelo maior estudioso brasileiro de Ken Wilber, Ari Raysnford: “Um GPS do ser humano”.
Wilber entende que a História não se separa da noção de consciência. A dinâmica histórica começa com a pré-modernidade, da Antiguidade até a Idade Média, na qual os três domínios fundamentais da atividade humana – a estética (o belo), a ciência (o verdadeiro) e a moral (o bem) – estavam fundidas sob a esfera da religião. Com o renascimento, que dá inicio a era moderna e que Wilber chama de “a dignidade da modernidade”, houve a diferenciação entre estética, ciência e moral (as três criticas kantianas são o exemplo máximo): o artista podia criar sem a preocupação de ser uma obra sacra, o cientista podia pesquisar livremente sem o temor de represálias eclesiásticas e temporais e a religião podia se preocupar estritamente com aquilo que lhe é próprio.
A pós-modernidade seria o passo seguinte. Uma vez feita a diferenciação seria necessária uma integração. Wilber aponta, no entanto, que ocorreu uma patologia nesse processo. Dissociação em vez de integração: os homens começaram a se apegar radicalmente e até emocionalmente com fetiches materialistas, idealistas, culturalistas, historicistas, processo que ele chamou de “absolutismo de quadrante”.
Dentro desse contexto, Wilber reavalia a noção de Dinâmica da Espiral de Clare W. Graves, Don Beck e Chris Cowan, e resgata o conceito de hólon de Arthur Koestler, demonstrando que a dimensão humana e da realidade em geral constitui uma tensão entre o todo/parte: tudo o que existe não é nem apenas todo nem apenas parte, tudo o que existe é um hólon, ou seja, uma tensão que nunca pode ser reduzida como mera parte ou como um todo definitivo, pois resguardam na sua estrutura aspectos qualitativos.
O desconhecimento dessa tensão básica tende a levar ao reducionismo, ou, na terminologia wilberiana, ao “absolutismo de quadrante”: o idealismo que crê que só a mente é a realidade, o cientificismo que crê que só a matéria é a realidade, o pós-modernismo que crê que todo significado construído culturalmente é a realidade e a teoria sistêmica que acredita nas estruturas sócio-históricas como sendo a realidade última.
A partir de 2002 Wilber iniciou sua quinta fase, tentando demonstrar que conhecimentos do tipo metafísico – no sentido de entidades de outro mundo e de clara conotação literal – surgem em momentos de pouco desenvolvimento intelectual. O filósofo não abandona o aspecto da transcendência, mas pretende reavaliar crenças antigas e superstições modernas, que fogem de nosso mundo objetivo e vivenciado.

Livros além da teoria integral


Com sua mulher, Treya, que morreu em sua cama, vítima de câncer.
Entre mais de 20 livros (sua obra-prima, Sex, Ecology, Spirituality, tem 880 páginas), Wilber escreveu também um romance e dois relatos sobre sua vida:
  • O volume autobiográfico One Taste (1999), ainda sem tradução, com diversas passagens sobre seu cotidiano de escritor, suas práticas de meditação e relatos de seu relacionamento.
  • O romance Boomerite (2002), fazendo uma crítica ácida e bem humorada da geração dos baby boomers e seus sucessores, nascidos entre 1946 e 1964, mostrando como a cultura americana desse período experimentava pela primeira vez uma concepção pluralista do mundo ao mesmo tempo em que criava as justificativas mais sofisticadas para endossar um narcisismo nunca antes constatado em nenhuma civilização.
  • E Graça e Coragem (1991), relato autobiográfico sobre vida, morte e transformação no relacionamento com sua esposa Treya e o câncer de mama descoberto logo após o casamento.

 

1. Qual sua posição em relação ao movimento New Age, já que muitos críticos assim identificam seu trabalho?
É comum que meu trabalho seja incluído no movimento New Age. Contudo, eu tenho sido bastante crítico desse movimento. Considero que, embora a maioria de suas ideias apontem na direção correta, elas basicamente não chegam a lugar nenhum.
Eu não concordo, por exemplo, com o fato de que muitos deles acreditem em astrologia. Não que eu tenha algo contra a astrologia, o fato é que já foram feitos centenas de testes utilizando astrólogos conhecidos e todos falharam. Não existe nenhuma evidência de que a astrologia funcione; sendo assim, a maioria das teorias em que o movimento New Age se baseia estão erradas por seguirem premissas desse tipo.
Penso que a crença de que eu seja um adepto do movimento New Age, quando na verdade eu seja um crítico dele, venha da mídia, jornais e revistas que na realidade não entendem muito bem a espiritualidade e assim rotulam um tanto levianamente meu trabalho sem entenderem todas as nuances e sutilezas que estão envolvidas.

Alex Grey vê em Wilber a espada de prajna, que corta todas as ilusões.

2. E quanto à psicologia transpessoal?

Quando eu comecei a escrever, era comum dizer que haviam quatro escolas de psicologia: psicanalítica, behaviorista, humanista e a transpessoal. Eu comecei escrevendo como psicólogo transpessoal, mas ao longo de dez anos eu pude constatar que a psicologia transpessoal apresentava muitas deficiências, não abria espaço para incluir muitas das verdades importantes das outras escolas.
Então eu formalmente me distanciei da psicologia transpessoal e passei a chamar aquilo que estava fazendo de psicologia integral. Naquela época, nos Estados Unidos, entre um terço e talvez a metade dos psicólogos transpessoais vieram a mim e passaram a se identificar como psicólogos integrais. O termo integral foi selecionado para tentar dar uma indicação de que incluíamos todas aquelas escolas de psicologia na tentativa de desenvolver modelos mais abrangentes.

3. Você escreveu um livro chamado “Uma Teoria de Tudo”. Você têm uma teoria para tudo ou isso é uma paródia?

O título foi uma brincadeira que fiz. A razão porque escolhi esse título é que, de fato, no mundo da física existe uma busca daquilo que se convencionou chamar “Uma Teoria de Tudo”. O que eu quis fazer foi dizer:
Espere um pouco, o que vocês estão chamando de “tudo” na realidade engloba uma parte muito pequena do mundo. Ao chamá-la de tudo e ao dizer que vocês têm uma teoria para tudo, vocês estão sendo incrivelmente reducionistas, ligando-se a um materialismo incrivelmente limitado onde não há espaço para o mundo interior: a consciência, as emoções, os valores, o bem e a beleza.
Vocês reduzem o mundo a quatro forças – força nuclear forte, força nuclear fraca, força eletromagnética e força gravitacional –, alegam que essas são as únicas forças que existem na natureza e assim, na teoria de tudo, vocês mostram apenas como essas forças interagem.
Bem, não resta dúvida de que seria uma descoberta importante se, de fato, fosse possível criar um único modelo físico que englobasse toda a realidade do mundo em que vivemos. Contudo, eu dei esse título para caçoar dessa noção de que você pode reduzir tudo a um punhado de partículas.
Uma outra razão porque eu usei esse título foi porque, se você quer uma teoria que vai falar sobre tudo, então eu ofereço um modelo que, pelo menos, engloba muito mais aspectos da realidade. Este meu livro foi, portanto, uma maneira de chamar a atenção para o fato de que a busca desse tipo de materialismo científico é, na realidade, uma filosofia muito pobre. Um alerta para que as pessoas tenha cuidado com esse reducionismo simplista.

Link YouTube |  Tudo o que você pode descrever sobre si mesmo não é você mesmo.

4. Os temas da religião, ciência e espiritualidade são constantes em sua obra. Como você os entende?

Eles são claramente três das mais importantes disciplinas que os seres humanos abraçam e são variações do Bem, da Verdade e da Beleza (ou Moral, Ciência e Arte).
A ciência, naturalmente, é muito importante por causa dos insights e a verdade que ela propicia nas dimensões objetiva e interobjetiva. As ciências trouxeram uma contribuição enorme ao mundo moderno e pós-moderno nos dando de tudo, desde a cura de doenças até nos colocar na Lua. É claramente uma parte importante do esforço humano no mundo.
Já a espiritualidade e a religião são interessantes porque ambas estão se tornando cada vez mais separadas. É comum para as pessoas nos Estados Unidos dizerem que “São espirituais mas não religiosas”, ou seja, elas estão separando ambas, elas se identificam com o espiritual mas não com a religião, existe algo sobre a religião que eles não apreciam e existe algo na espiritualidade que eles gostam e esta é a razão deles se definirem daquela forma.
A espiritualidade significa uma consciência mística de uma experiência imediata, que passa diretamente por alguma forma de experiência que não pode ser descrita como parte de alguma mitologia ou dogma, mas pura e simplesmente uma experiência imediata. A religião para essas pessoas significa as formas institucionais de religião e seus mitos, crenças e dogmas; e elas não se sentem mais confortáveis com esse tipo de religião mas se sentem confortáveis com aquilo que eles denominam de espiritualidade, que consiste em não acreditar em dogmas e sim em um processo que emerge na consciência pessoal.
Claramente ambas existem e são importantes para os seres humanos. Provavelmente cerca de 60% da população mundial frequenta algum tipo de religião institucional, seja ela islamismo, judaísmo, cristianismo, budismo ou hinduísmo, eles acreditam em seus fundamentos, sendo muito importante o significado de tudo isso em suas vidas.
Essas questões são centralmente importantes para a condição humana e , assim, continuo a escrever sobre ciência, espiritualidade e religião em uma tentativa de mostrar como elas se fundem e como elas podem ser incluídas em uma visão de mundo coerente.

Com o padre Thomas Keating, num diálogo sobre cristianismo e espiritualidade integral.

5. Em 2007, o Dr. James Watson, co-descobridor da hélice dupla do DNA, prêmio Nobel de 1962, fez declarações interpretadas como racistas, estimulando a imagem popular do gênio científico a serviço do mal. Como podemos entender esse paradoxo?

Esta é uma das razões por que é importante olharmos todos os cinco elementos que compõem o Modelo Integral. O que descobriremos quando olharmos as linhas de desenvolvimento é que elas podem se desdobrar de uma maneira muito desigual. Este é o caso de alguém que é altamente desenvolvido cognitivamente, mas moralmente subdesenvolvido.
É um fator importante para se levar em conta para entendermos alguns desses tipos de declarações. Os racistas são indivíduos que podem apresentar um desenvolvimento cognitivo alto e um desenvolvimento moral muito pobre, e o fato de que eles obtenham alta pontuação em testes de Q. I. não significa que esses pontos possam ser traduzidos em feitos concretos – estamos falando de inteligências múltiplas.

6. Frijof Capra e Amit Goswani, que professam um “novo paradigma” misturando física quântica com religião, e ateus no outro extremo – Richard Dawkins, Hitchens, Dennett e Sam Harris – parecem nadar contra a corrente daquilo que você vem propondo. Qual sua posição frente a essas tendências do debate contemporâneo?

O que eu tenho a dizer é que ambos os lados estão errados.
Começando com Richard Dawkins e cia, eles estão simplesmente negando todas as formas de espiritualidade. O que isso quer dizer, na maior parte das vezes, é que eles estão negando as formas literais e míticas da religião. Abordando a questão no nível científico, eles naturalmente descartam o nível mítico, crítica com a qual eu concordo em parte, contudo existem outros tipos de espiritualidade que precisam ser reconhecidas e entendidas.
Eles simplesmente jogam ralo abaixo o bebê junto com a água do banho.
O outro grupo, do Tao da Física, está querendo dizer inocentemente que as afirmações da física quântica e os ensinamentos das tradições de sabedoria são idênticas. Eu até entendo o que eles estão querendo dizer, porém eu não acredito que seja verdade. Penso que tanto a mecânica quântica quanto a espiritualidade sejam verdadeiras mas não creio que a física quântica possa provar ou demonstrar a não-dualidade espiritual.
Em primeiro lugar, a mecânica quântica é um esquema de símbolos de terceira pessoa: quando você experimenta a mecânica quântica você não está tendo nenhuma experiência mística, você está apenas lidando com um esquema de símbolos matemáticos. É essa operação matemática que eles dizem ser mística, mas não há nada de místico na mecânica quântica. Portanto, em todo esse debate ambos os lados cometeram grandes erros. Eu até posso concordar em parte com o que eles estão dizendo, mas essencialmente eles estão assumindo posições incorretas em termos de espiritualidade.

Link YouTube | Sátira ao filme new age “What the bleep do we know” (“Quem somos nós”), com falas de Amit Goswami.

7. Você escreveu um romance criticando o narcisismo da geração Baby Boomer (Boomerite, 2002). O que você pensa sobre essa nova geração que vive a era da Internet e parece ficar confusa entre o mundo real e o virtual?

Tenho um sentimento confuso com relação a essa questão porque a impressão que tenho é que há um desnível entre o que eu percebo por estar lidando diretamente com os jovens no Instituto Integral e o que parece estar acontecendo lá fora.
Os jovens com os quais eu travo contato me parecem surpreendentes: não são narcisistas, são inteligentes e demonstram possuir um desenvolvimento saudável. Parece, assim, ser uma grande geração.
Contudo, algumas das coisas que eu leio sobre essa geração são de fato perturbadoras. Nos Estados Unidos, por exemplo, alguns alunos recentemente graduados das escolas secundárias receberam testes para medir o Q.I. e também para avaliar o seu grau de narcisismo. De acordo com esses testes parece que essa geração é a mais narcisista de todos os tempos.

8. Quais são as principais características do novo milênio e quais são os desafios que atualmente a humanidade precisa enfrentar?

É interessante notar que pela primeira vez na história os principais problemas mundiais são globais e são essencialmente provocados pela ação do homem – e isso inclui coisas como a crise global financeira, a crise ambiental das mudanças climáticas e o terrorismo.
Essas questões são de fato globais, são tendências transnacionais e não há nada que uma nação individualmente possa fazer. Então, estamos enfrentando não apenas problemas que são globais em sua natureza, mas que exatamente por isso as suas soluções precisam, também, ser globais.

Agradecimentos

Gostaria de agradecer ao Dr. Ari Raynsford, o maior especialista na obra de Ken Wilber no Brasil, que gentilmente me recebeu em sua casa me esclarecendo sobre diversos pontos da vida e da obra wilberiana.

Jornalista, formado em Direito e Filosofia, cursou filosofia na Harvard Extension School e é colaborador do jornal O Estado de S. Paulo, Revista Cult e Revista Dicta & Contradicta. Trabalha na É Realizações (@erealizacoes).

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Para os mais interessados, há inúmeros longos textos em português na sala de leitura do site do Ari Raysnford.

 

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