STF cancela reintegração de posse de aldeia indígena em SP
Raquel Brandão |
Estadão Conteúdo – maio de 2015
Dois
meses depois da liminar da Justiça Federal que pedia a reintegração de
posse imediata da área da Tekoa Itakupe (em guarani mbya, itakupe
significa atrás da pedra, em referência ao Pico do Jaraguá), o
presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, decidiu
nesta sexta-feira, 15, pela suspensão da medida. Antes da decisão, os
índios guarani que vivem na Terra Indígena (TI) do Jaraguá, assim
declarada pela Funai, teriam de desocupar o terreno a partir do dia 25,
como ficou decidido após uma reunião entre a Polícia Militar e Antônio
Tito Costa, que reclama a propriedade das terras.
"Entendo
prudente que a decisão judicial objeto desta suspensão seja
provisoriamente suspensa, neste momento, para que o juízo da 10ª Vara
Federal em São Paulo promova uma tentativa de conciliação entre as
partes ou, então, justifique eventual impossibilidade de levá-la a
efeito", publicou Lewandowski.
Apesar da reintegração ter sido suspensa, a ação judicial movida por Antonio Tito Costa em 2005 ainda deve ser sentenciada.
Disputa na Justiça
Em
março deste ano, a Justiça Federal determinou a reintegração imediata
do terreno. A determinação veio depois de um agravo solicitado pelo
advogado Antônio Tito Costa, que foi deputado federal e prefeito de São
Bernardo entre 1970 e 1990. A disputa pelo território está na Justiça
desde 2005, quando os indígenas ocuparam pela primeira vez o espaço.
"Nós ficamos seis meses aqui, mas naquela época não tínhamos apoio",
explica o cacique Ari Augusto Martim.
Em
24 de abril de 2013, o despacho nº 544 da então presidente da Funai,
Marta Maria do Amaral Azevedo, delimitou a TI do Jaraguá: um território
de 532 hectares que se expande pela aldeia Tekoa Ytu, já demarcada, por
sítios da região, incluindo o terreno reclamado por Tito Costa e,
também, por uma área do Parque Estadual do Jaraguá.
A área de 72 hectares teria sido adquirida pela família da falecida mulher de Tito Costa e um sócio, em 1947. "Nossa área nunca foi habitada por índios. A Constituição diz que terras indígenas aquelas que são habitualmente ocupadas por índios e que nelas produzem. Está inteiramente fora dos critérios da Constituição. Esse laudo da Funai é só um laudo antropológico."
Apesar
da TI Jaraguá ser considerada território tradicional pela Funai desde
2013, ainda não foi publicada portaria declaratória pelo Ministério da
Justiça (MJ) e, por consequência, tampouco houve a homologação da
Presidência da República. De acordo com o MJ, "o processo de demarcação
da Terra Indígena Jaraguá foi restituído à Funai para cumprimento de
diligências e retornou no dia 30 de janeiro de 2015 ao Ministério da
Justiça, onde está sob análise da Consultoria Jurídica."
A menor aldeia do Brasil
Segundo
a Funai, 600 indígenas vivem na TI Jaraguá, sendo 42,6% de crianças de
até 10 anos. É nessa região que está a menor terra indígena já demarcada
no País, a aldeia Tekoa Ytu, com 1,7 hectare. Sua demarcação foi feita
em 1987, antes da atual Constituição, que promoveu mudanças nas
demarcações de territórios tradicionais.
A
extrema restrição de terreno é determinante para os indígenas, que
vivem da agricultura, e é o que mais os motiva a lutar pela demarcação
do território tradicional. "É uma terra muito pequena e que não é
apropriada para se manter a tradição guarani. Toda nossa história é por
meio do alimento sagrado", explica Karai Popygua, nome guarani de David
Martim, morador e professor na aldeia. Hoje, além de não terem espaço
para plantar, os guaranis enfrentam a superlotação e condições
precárias, como falta de tratamento de esgoto e excesso de cães, que
constantemente são abandonados no local.
Apesar
das atuais famílias guaranis terem se estabelecido na TI Jaraguá em
1950, segundo o relatório da Funai, a documentação história indica que o
terreno é composto por terras vinculadas ao antigo aldeamento de
Barueri, do século 17, o que tornaria o terreno tradicionalmente
indígena. Essa também foi a análise da pericia isenta solicitada pela
Justiça na ação. De acordo com resposta enviada pela Funai à reportagem
do Estado, "a perícia judicial atesta as conclusões da Funai de que a
área em litígio é de ocupação tradicional Guarani".
Além
da Tekoa Ytu, desde a década de 1990, os guaranis ocupam 3 hectares na
Tekoa Pyau - sob litígio - que fica ao lado e que antes dedicavam apenas
à plantação.
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