Operação Eldorado (2012): Mato Grosso, divisa c/ o Pará*. |
Sua mãe usa ouro roubado de índios?
maio/2015Autor: SERVA, Leão
Fonte: FSP, Cotidiano, p. B2
O combate ao garimpo ilegal em áreas indígenas só será efetivo quando toda a sociedade colaborar
Leão Serva
Você provavelmente não ficou sabendo que a Polícia Federal deflagrou na semana passada uma das maiores operações já realizadas contra o garimpo ilegal na Terra Ianomâmi. Não é sua culpa: são realmente tabu na imprensa brasileira as notícias sobre o calvário que sofre o maior grupo indígena com pouco contato do planeta.
A ação teve 313 mandados judiciais contra acusados de formar um esquema criminoso que inclui empresários, funcionários públicos, donos de garimpos, joalheiros e pilotos de aviões. Segundo levantamento do órgão, a mineração tira da área no extremo norte do país (Roraima e Amazonas) duas toneladas de ouro por ano, ao preço estimado de R$ 200 milhões.
A cobertura nula ou discretíssima impediu que a opinião pública se desse conta de uma coincidência macabra: enquanto os policiais prendiam joalheiros por receptação de ouro ilegal na Amazônia, no resto do país, pessoas com dinheiro davam joias a suas mães.
Você comprou joias de ouro nos últimos anos? Ou talvez, para se proteger da inflação, comprou papéis vinculados a reservas de ouro, emitidos por uma Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs) como as que atuam na BMF/Bovespa? Pediu alguma garantia de que o metal precioso não foi retirado ilegalmente de área indígena, onde a extração causa mortes de índios?
Todo garimpo em áreas indígenas é ilegal. Ele destrói patrimônio dos brasileiros, terras da União ocupadas por esses grupos para preservar o ambiente. Os índios cumprem sua missão constitucional: fotos de satélite das florestas brasileiras mostram que os parques indígenas estão entre as (poucas) áreas bem preservadas.
Nos últimos anos, as operações da PF denominadas Xawara (2012, em Roraima) e Eldorado (mesmo ano, no Pará e em Mato Grosso) indicaram que um dos destinos finais do ouro são corretoras de títulos: ou seja, o metal também serve como investimento seguro e moderno contra desvalorização da moeda.
A mineração ilegal que alimentou guerras civis e genocídios na África levou à criação de dois convênios internacionais para controle do comércio mundial de ouro e diamantes. O Certificado Kimberley é exigido de quem vende diamantes, para provar que as pedras não vieram de áreas conflagradas. O Padrão Ouro Livre de Conflitos é adotado para o metal.
O Brasil é um produtor de diamantes e ouro, mas o controle da atividade ilegal é pífio: como costuma acontecer com a fiscalização no país, ora é ineficiente, ora corrupta, ou simplesmente não é prioritária. E os dois protocolos internacionais não consideram "zonas de conflito" as áreas indígenas latino-americanas ameaçadas pela mineração.
O Brasil só vai abalar a produção ilegal de ouro e diamantes de áreas indígenas quando a cidadania se preocupar e exigir que os comerciantes tenham uma cadeia de produção limpa de sangue. Como aconteceu com a carne, quando entidades da sociedade civil propuseram um boicote aos açougues que não provassem que seu gado não vinha de áreas de preservação da Amazônia. Rapidamente, os grandes supermercados se submeteram à restrição.
Enquanto isso não acontecer com a mineração, vamos ver índios morrendo de fome e malária enquanto a PF enxuga gelo em repetidas operações de combate ao garimpo, todas inócuas no longo prazo.
FSP, 11/05/2015, Cotidiano, p. B2
http://www1.folha.uol.com.br/
http://pib.socioambiental.org/
* legenda da foto:
Operação Eldorado (2012), combate a extração ilegal de ouro no Norte de Mato Grosso, em garimpos e áreas indígenas na divisa de Mato Grosso com o Pará. resultado: 17 pessoas foram presas, 28 mandados de prisão temporária e mais 64 de busca e apreensão expedidos; apreensão de 23 quilos de ouro, além de dinheiro, em reais e em várias moedas estrangeiras.
outra notícia, no mesmo mês:
Operação da PF investiga extração ilegal de ouro em reserva indígena
07/05/2015
Fonte: OESP - http://politica.estadao.com. br/noticias
Operação da PF investiga extração ilegal de ouro em reserva indígena
Esquema em terras Yanomami, em Roraima, faturava R$ 17 milhões por mês e envolve empresários e funcionários públicos
Andreza Matais - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - A Polícia Federal deflagrou na madrugada desta quinta-feira, 7, uma operação para desarticular esquema criminoso de extração ilegal de ouro e pedras preciosas nas terras da reserva Yanomami, em Roraima. O esquema criminoso faturava R$ 17 milhões por mês e provocou forte degradação ambiental na área.
Batizada de Warari Koxi, a operação aponta para o envolvimento de empresários, funcionários públicos, donos de garimpos, joalheiros, pilotos de aeronaves responsáveis por instalar garimpos de ouro, minerais de uso industrial e outras pedras preciosas na reserva indígena na região de Boqueirão e Uraricoera, extremo norte de Roraima.
As investigações apontam que são retirados de forma ilegal das áreas de garimpo em torno de 160 quilos de ouro mensalmente. O valor da grama é cotado a R$ 110, o que garantia o faturamento milionário mensal. O dinheiro do esquema seria usado para lavagem de outras atividades ilícitas. As movimentações atípicas dos envolvidos atingem o valor de R$ 1 bilhão.
Além do valor, os investigadores também se impressionaram com a forma como o ecossistema vinha sendo degradado pela atividade extrativista, altamente poluente com mercúrio e outros metais pesados, além da destruição da fauna e flora e da cultura Yanomami.
A operação envolve a ação de 150 policiais para o cumprimento de 313 mandados em Roraima, Amazonas, Rondônia, Pará e São Paulo. Os crimes investigados são: associação criminosa, extração de recursos naturais de forma ilegal, uso indiscriminado de mercúrio, corrupção passiva, violação de sigilo funcional, contrabando, lavagem de dinheiro, operar instituição financeira sem autorização do Banco Central. As penas para esses crimes podem chegar a 54 anos de prisão.
O nome da operação refere-se a expressão usada pelo povo Yanomami para definir intervenção negativa do meio ambiente saudável e significa "espírito de porco" dos que degradam o seu ambiente de convivência.
http://politica.estadao.com.
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