sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

o lado material e o lado espiritual da vida - parte II

 

vida material ou vida espiritual – II


Vivemos em um mundo e estamos a todo tempo diante do dilema: vida espiritual e vida material... Qual dessas vidas realmente pode nos trazer paz e felicidade?

A matéria ou o espírito? Qual deve ser nossa prioridade? 

Salvar a alma? O que significa ter "alma"? Nós temos uma alma?

Alguém pode ser feliz psicologicamente ou ter paz espiritual se estiver com alguma dor terrível no corpo ou sentindo fome ou com sede?

Com o quê vale a pena realmente se preocupar?

E, afinal, por que é importante se questionar sobre isso?

 

Porque aquilo em que você acredita (o paradigma que você aceita como explicação do mundo), pode moldar e alterar seu julgamento, seu comportamento e a própria forma como você experimenta/vivencia aquilo que você chama de realidade. 

O mundo, a realidade, é aquilo que você percebe como sendo o mundo, a realidade.

Tudo, absolutamente tudo, está na dependência da sua percepção. O que o permeia, tanto o que está aparentemente "fora", como o que parece estar "dentro", tudo depende do que você percebe... e só você experimenta o mundo do modo como você experimenta (seja essa experiência repleta de sofrimento, seja de felicidade).

Talvez o mais comum seja a pessoa acreditar que vive em um mundo real e objetivo, portanto, idêntico para todos os outros. Pouquíssimos se questionam a esse respeito.

Assim, do mesmo modo, poucas pessoas questionam sua própria visão de mundo. Nossa "visão de mundo", contudo, é nossa própria forma particular de enxergar (interpretar) as coisas, e os acontecimentos.

Acontece que é a “visão de mundo” que sempre se sobrepõe àquilo que todos entendem como sendo a “realidade objetiva"... 

Ou seja:  o mundo é como eu vejo"... e se alguém vê diferente de mim, provavelmente está enganado, pois como é que o mundo poderia ser diferente do modo como eu vejo?...”

Só que geralmente nos esquecemos que o mundo que nossos sentidos captam (primeiro filtro), é quase instantaneamente decodificado pelo cérebro (segundo filtro), para, logo em seguida, ser submetido à interpretação de nossa mente individual (terceiro filtro), incluído aí todos os moldes e recortes culturais, linguísticos e semânticos de nossos paradigmas.

Assim é que, aquilo que eu chamo de “realidade”, de fato é um produto específico e subjetivo, fabricado por mim mesmo, pelo meu modo muito particular de interpretar aquilo que eu acredito que está acontecendo ao meu redor e simultaneamente, dentro de mim... 

De fato, aquilo que julgamos ser o "mundo físico" (real e concreto), não passa de uma 'criação' de nosso próprio conjunto mente-cérebro*. Se a Física já sabe que a maior parte do espaço é absolutamente vazio, se já se sabe que a quantidade de matéria existente em um átomo é tão pequena que é quase "inexistente", seria importante pararmos por um instante para refletirmos sobre qual é a real diferença entre o "mundo físico", em oposição àquilo que comumente chamamos "mundo não físico".

A Física Quântica tem demonstrado que aquilo que nos dá a aparência de materialidade, a aparente solidez e "realidade" das coisas, é de fato, apenas "campos de energia", "padrões vibratórios". O modo como tais campos são 'percebidos' por nossos cérebros é que nos dá a sensação de materialidade e aparente densidade das coisas do mundo dito "exterior".

A Ciência ortodoxa, assim como os místicos, já sabem que tudo que percebemos como "externo" a nós, na verdade é fabricado "dentro" de nosso corpo, no âmbito do cérebro-mente*.

Idêntico processo acontece a cada momento dentro de cada pessoa, sem que possamos, é claro, garantir, qualquer similitude ou igualdade entre como cada um "capta" e interpreta as impressões/sensações que percebe...

É nesse ponto que as coisas realmente ficam confusas, pois se aquilo que acredito ser a “realidade”, não passa de uma projeção criada/fabricada pela minha consciência condicionada, vale dizer, fabricada pela mente e pelo corpo, então como seria possível distinguir entre mundo exterior e mundo interior, entre vida material e vida espiritual?

Se nosso paradigma é dualista, será óbvio pensar/imaginar o mundo por intermédio de dualidades, por pares de opostos definidos e quase sempre irreconciliáveis e inconfundíveis: 

"mundo material e mundo imaterial/espiritual", 

"intelecto/racional versus emoção/irracional", 

"corpo versus alma/espírito", 

"sujeito versus objeto", 

"mundo interior e mundo exterior",

"mundo das aparências (fenômenos) e mundo verdadeiro (essências)... 

 

Tais pares de opostos inspiraram dezenas de correntes filosóficas, místicas e artísticas, pelo menos ao longo dos últimos 2.500 anos de história.

No final das contas, não é necessário discutir sobre a realidade das coisas, já que sequer sabemos diferenciar mundo real e mundo irreal.

A única coisa que importa sempre, é como reagimos àquilo que chamamos realidade, seja ela de qual natureza for...

Observe seus sonhos e irá entender o porquê:

Enquanto sonhamos em nossas camas, nossa “experiência” nos diz que estamos vivendo o mundo real. Raras vezes o sonhador dá-se conta de que seu sonho é apenas isso: um sonho, uma criação de sua mente-cérebro.

O sonho é um ótimo exemplo de como uma criação subjetiva de nossa própria mente, pode ser facilmente confundida com a “realidade externa e objetiva”. Para o sonhador, sua vivência é tão real quanto qualquer experiência do estado de vigília (aquela de quando seu corpo físico está "acordado").

Então, o que você pode concluir? Seja a ilusão, seja a realidade, o que importa é como reagimos.

Seja no mundo material, seja no espiritual, seja no aparente exterior, seja no aparente interior... a ilusão está lá!  nós mesmos a criamos, é claro.

Não é que nada exista, além de nós mesmos. Não se pode incorrer nesse erro simplista de interpretação literal. Quando dizemos que o "mundo é ilusório", isso não quer dizer que não exista... Ele, de algum modo existe, sim, é óbvio. Só que não existe do modo como a maioria de nós acredita que exista. Ele é tão efêmero, tão impermanente, tão mutável e transitório, que não podemos nos iludir acreditando que o possuímos, que o detemos, que o podemos agarrar e segurar com nossas mãos... não... não....não...

Mas o fato é que nossa imaginação “cria” a aparência dos objetos, dos entes e dos acontecimentos... e confia que "as coisas/situações são como aparentam ser"... eis a ilusão! 

Sim, nossa capacidade imaginativa mental “cria” as imagens, as ideias e os pensamentos (crenças) sobre tudo, desde os objetos mais ordinários e grosseiros até os mais inefáveis e espirituais...

Não se espante que nossas ideias sobre os objetos mais simples do dia a dia sejam tão equivocadas quanto nossas ideias sobre Deus, sobre o Nirvana, sobre os Céus e sobre os Infernos...

Assim, o mundo (com absolutamente tudo que nele há) é naturalmente efêmero, transitório e passageiro, como tudo que nossa mente/corpo cria. Por trás desse véu, há aquilo que permite que tudo seja, o Ser que não se pode definir, o indizível, a base de sustentação imutável e sem dimensões, sem forma e sem atributos... base esta a qual nossa mente não tem acesso pela experiência empírica...

Ora, a própria mente pensante, em si mesma, também é impermanente... consequentemente, também ela é, de certo modo ilusória... Sua única realidade é aquela que nós atribuímos a ela. Nossos pensamentos, ideias, medos, conceitos, suposições, crenças, etc, tem o valor que nós damos a eles, tem o poder que damos a eles, nada mais, nada menos. Pensamentos, ideias, fantasias, emoções e sentimentos oscilam, surgem e duram, às vezes, alguns dias ou algumas horas, mas o mais comum é que durem alguns minutos ou segundos...  para logo desaparecerem.

Pergunte-se: O quê é que nossos pensamentos, ideias, fantasias, emoções e sentimentos tem a ver com a Verdade imutável?

Responda a essa pergunta e saberá o valor de tudo o que você pensa e imagina incessantemente.

Por isso, não leve seus pensamentos tão a sério... eles não vale a sua energia, a sua atenção, o seu esgotamento e o seu sofrimento.

Pense: se algo muda, deixando de ser aquilo que parecia ser, então isso que muda não é o real/verdadeiro. Busque o que é real, verdadeiro, perene e imutável! Só aquilo que permanece eternamente, É. 

 

Algumas conclusões:

Aquilo que oscila e se transforma, incessantemente, aponta para aquilo que NÃO É.

O bonito, em dado momento, se torna feio...

o jovem envelhece...

o cheiroso torna-se mal-cheiroso...

o prazeiroso torna-se monótono, cansativo e aborrecedor... fonte de dor e sofrimento...

o quente se torna frio...

etc...etc...etc...

Então, qual a realidade de tudo que você experimenta?

O mundo material (que chamamos “exterior”) ou o imaterial (“interior” ou “espiritual”)?

Se ambos mudam constantemente, qual deles é a expressão da Verdade?

Por fim, ambos os aspectos (material e espiritual) se fundem num todo único. O corpo reflete o que se passa na mente... e a mente só espelha o que se passa no corpo.

O que nosso corpo sente depende daquilo que a mente “vê”.

E aquilo que a mente vivencia depende do que o corpo lhe apresenta por meio de sentidos e do seu aparato cerebral.

Então, simplesmente não podemos provar que estamos vivenciando um “mundo exterior” ou um “mundo interior”. 

Nossa percepção e entendimento são tão facilmente enganados, que sequer podemos garantir que neste momento, estamos "acordados".

Então, enquanto não despertamos nossa consciência, indo além do que a mente nos apresenta, continuamos sonhando, seja em um nível, seja noutro.

A matéria em si, é apenas um conceito. Ninguém sabe o que é a matéria, nem a ciência, nem a filosofia... os poetas, pelo menos, admitem que não sabem.

Então, podemos parar de alimentar essa dualidade entre mundo espiritual e mundo material, pois não há absoluta separação entre eles. É verdade que podemos "perceber" difeerentes dimensões, umas mais sutis que outras... mas uma análise intelectual de tudo isso em nada nos ajuda a despertar consciência.

O que desperta consciência é o autoconhecimento. Só o conhecimento absoluto de si mesmo nos permite conhecer o “mundo” e o “Criador do mundo”.

E como despertamos consciência? Parando de acreditar na ilusão projetada pelos pensamentos, conceitos, crenças etc... Indo além do corpo, da mente, do pensamento e do ego. Indo do pensamento para a meditação. Do pensar para o não-pensar... ou seja, meditando.

Em que consiste a meditação? Ao contrário do que muitos pensam, meditação não significa não-ação, inação ou passividade.

Meditar é ver quando estiver vendo, comer quando estiver comendo, andar quando estiver andando, fazer quando estiver fazendo. Só isso.

 

 

para saber mais:

vida material ou vida espiritual – I

https://oficina-de-filosofia.blogspot.com/2018/07/vida-material-e-vida-espiritual.html

 

O que é a matéria?

https://oficina-de-filosofia.blogspot.com/2014/07/o-que-e-materia-o-que-e-voce.html?q=o+que+%C3%A9+a+materia

 

O que é o tempo e o espaço?

https://oficina-de-filosofia.blogspot.com/2020/04/tempo-e-espaco-o-que-sao-eu-e-o-outro-o.html?q=mundo+interior

 

* Os sentidos do corpo não são "portas ou janelas" por meio das quais temos acesso direto ao "mundo exterior"; Nossos sentidos são, objetivamente, tecidos orgânicos dotados de terminações nervosas sensíveis a certo número limitado de ondas e frequências... nossos sentidos captam uma gama pequeníssima de impressões que nos circundam fisicamente... e é com elas que nosso cérebro/mente 'constrói' aquilo que depois chamaremos de 'realidade exterior'... 

Aquilo que a ciência chama de 'impulsos elétricos', 'ondas', 'fótons', 'frequências', são continuamente transformadas, filtradas e depois ainda interpretadas. Tudo aquilo que nosso aparelho físico conseguiu 'perceber', o cérebro/mente vai 'selecionar', segundo critérios de relevância pouco conhecidos. Assim, aquilo de que tomamos ciência (e que portanto consideramos 'real') trata-se de mera "representação interna", psicológica e mental.  

 

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