domingo, 24 de agosto de 2014

o contato com os outros

a relevância do contato com as outras pessoas para o autoconhecimento

Podemos pensar que o melhor ambiente para se atingir a felicidade e a iluminação seja um local onde não tenhamos perturbações... um 'local', onde não haja sons desagradáveis, nem pessoas irritantes. 
Pensamos logo em um lugar para 'refúgio', um lugar onde prevaleça a 'harmonia', onde as pessoas se respeitem e nos respeitem. 
Mas no mundo em que vivemos, os locais que abrigam as agremiações, escolas, religiões e demais associações de pessoais são compostas de pessoas. E as pessoas estão cheias de egos e defeitos. 
Por conta disso, eventualmente haverá atrito. A vida em comunidade (seja ela um clube, uma escola de autoconhecimento ou um partido político), funciona como um pilão de arroz, como dizem os monges zen budistas: "batemos no arroz e porque um se arrasta no outro, perde a casca". Todos sofrem com atritos; isso deveria servir para perdemos nossa casca e nos tornar cada vez mais puros. 

Porém, o que fazem nossos eus?  não perdem a oportunidade de “ver defeitos e dificuldades nos outros" ou (menos comum, mas igualmente nocivo), ver defeitos e dificuldades em si mesmos.... É fato que tudo aquilo no qual nos concentramos, espontaneamente aumenta de tamanho/intensidade... Exemplo: Se nos concentramos em algum som, esse som se torna cada vez mais vívido para nós; Outro exemplo: se nos concentramos em um objeto ou em algum problema que estamos tentando resolver, este se torna cada vez mais "intenso" em seus detalhes, sua realidade é amplificada subjetivamente pelo simples fato de estarmos atentos a ele... ele "cresce", todos os sentidos agora se dedicam a alimentar sua existencialidade...

Então, por que damos tanta atenção a algo que gostaríamos de eliminar (defeito, problema, irritação)? O efeito será justamente o contrário! Se queremos nos livrar de algum problema ou ego, não podemos simplesmente deixar a mente se ocupar dele. Problemas são alimentos para a mente. E a mente, com sua energia, fortalecerá nossa percepção do aparente problema que se apresentou. 

Deixemos, portanto, de ressaltar (reclamar) dos defeitos ou problemas, pois o único efeito seguramente alcançado será a ampliação de sua percepção. O problema, o defeito ou a irritação, parecerão maiores, mais importantes e mais poderosos do que realmente são. O que era simples de resolver, se torna complicado... O que era fácil, se torna difícil. O que era contornável, se torna intransponível.
O que mais nos atrapalha, é termos um ego (um conjunto de eus pensantes, tagarelantes). "Esse ego nos proporciona uma vaidade, uma noção de separação. Estou separado dos outros, por causa disso, eu penso que ajo melhor do que os outros". 

Assim, devo me calar a respeito dos defeitos, tantos os meus, quanto os dos outros. Sobre minhas dificuldades, também devo me calar, pois não é útil ficar falando sobre elas. O melhor caminho é o silêncio. Calar e agir. 

Quando alguém nos aponta um defeito nosso, em geral interpretamos isso como um ataque. Nesse momento, devemos nos perguntar: “Quem se incomodou?”, “Quem se importa com isso?”. Meu orgulho e minha vaidade se importam com isso, por isso me importo quando sou criticado. Meu orgulho e minha vaidade são os meus verdadeiros inimigos. Se estou prisioneiro do ego, sou prisioneiro de nascimento e morte. Eu nasço e morro porque tenho um ego. Se eu morrer para mim mesmo, não existe mais ninguém para morrer. Para perder o medo da morte, devemos perder o medo de ter um ego ferido. Para nos livrarmos da morte, temos que morrer agora. 
Morri para mim mesmo, nada importa. Se nada importa, se o que os outros dizem não importa, se não existe nada que possa me ferir, então, eu superei o ego. Mas isso é muito difícil. Por isso a meditação: “sente-se e abandone-se, esqueça o passado, esqueça o futuro, esqueça-se de si mesmo; se se esquecer de si mesmo, então estará livre”. 

Enquanto houver comentários discriminativos – “gosto disso e não daquilo” – há um ego se manifestando. “Eu prefiro isso” é um ego falando. “Não gostei da atitude de Fulano” é um ego falando. “Eu gostei do elogio que o professor me fez” é o ego falando. Esse ego é nossa ilusão, nossa prisão fundamental. Por causa dele nós estamos aqui, presos em corpos e por causa dele nós nascemos e morremos. 

O ensinamento de todas as escolas esotéricas e religiões autênticas consiste principalmente em morrer para si mesmo. Morrer para seu próprio ego, morrer para sua vaidade, é para isso que devemos treinar. Não é para sermos importantes, sermos iluminados, alcançarmos algo, sermos melhores que outros, não é para nada disso. É para nos esquecermos de nós mesmos. Enquanto pensarmos “eu sou melhor”, estamos presos.




fonte: Meihō Genshō, zen-budista.


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