Não
é preciso ser experto em filosofia da educação, sociologia ou administração, para constatar a falência do que chamam sistema
educacional brasileiro.
As políticas educacionais têm se mostrado paupérrimas e obsoletas, nem adaptadas aos propósitos neoliberais, muito menos ainda comprometidas com algum projeto progressista de transformação social.
Ao contrário, apesar dos discursos politicamente corretos e de dados estatísticos questionáveis, o que se vê é uma prática sistemática de desvalorização do profissional da educação, que já vem de muitos ontens. A ordem é desmoralizar... iniciando pela filosofia e terminando com o educador.
Mudanças
pontuais aqui e ali, aliadas a uma remuneração ridícula e a péssimas condições
de trabalho são a receita certa para o desastre. Estamos em rota de colisão com
o caos... Assim, todos sabemos que não importa qual filosofia ou pedagogia se
adote: todas fracassarão, enquanto projeto macro. O que nos importa desvendar
agora é: a quem e por que interessa o caos na educação?
Cada um pode tirar suas próprias conclusões, considerando a necessidade de se manter a imensa massa mergulhada na 'inapetência ética' que caracteriza nossa época. O cidadão de segunda categoria não pode receber uma instrução escolar tão ruim que ele seja incapaz de obedecer a instruções relativamente complexas num ambiente cada vez mais 'tecnológico', nem tão qualificada a ponto de torná-lo um sujeito crítico, apto a refletir e a exercer plenamente a cidadania.
Filosoficamente
falando, o pano de fundo é uma crise muito mais ampla que costumamos chamar de
“crise de paradigma”. Há uma crise visível em todos os âmbitos: na religião, na
ética, na política, no sistema financeiro e... na educação, é claro.
O que não é facilmente visível é a sua causa. É aí que entra a filosofia! Enquanto uns se ocupam com o visível, com o diagnóstico de sintomas (papel das ciências), a filosofia vai em busca da causa oculta, da raiz do fenômeno, busca pelos porquês. Se fracassamos na compreensão dos porquês, fracassamos no resto.
Todo
bom educador tem que ser um pouco filósofo às vezes. Só assim ele continua vivo
como professor, e escapa de tornar-se um funcionário burocrático.
A transdisciplinaridade, apontada como solução para a crise, só representa solução quando se liga a uma ampla reforma do pensamento.
A transdisciplinaridade, apontada como solução para a crise, só representa solução quando se liga a uma ampla reforma do pensamento.
A inteligência que só é capaz de ver o mundo
fragmentado é míope e, minando as possibilidades de reflexão, torna-se
irresponsável, amoral e incapacitada de compreender o contexto em que vivemos
hoje.
Mas, quem educará os educadores?
O filósofo francês Edgar Morin defende que “é
necessário que se auto-eduquem”. Ninguém vai nos presentear a autonomia da
alma, nem tampouco a capacidade de questionar e de mudar nossa
própria realidade. Esqueçam!
Ora, o poder está diluído e circula por toda a rede
de relações humanas, já alertou M. Foucault. Não está apenas na esfera política
ou na esfera econômica. Pelo professor também circula um poder: o poder de
educar é formidável, tem potencial para transformar mentes. Querem desacreditar
o professor de sua alquimia, de seu poder magnífico.
Quem somos nós, professores?
Qual nosso papel?
Afinal, a quê viemos??
Vamos preferir passar o nosso tempo destilando nosso
ódio e mágoa pelo sistema? Temos um projeto de mudança do nosso entorno? O que
temos produzido? O que temos oferecido ao mundo?
Educação e Cidadania
O treinamento puramente
técnico não é suficiente. O cidadão tem o direito de saber como funciona sua
sociedade, a razão do procedimento técnico no qual ele está sendo instruído, de
refletir sobre as implicações positivas e negativas da tecnologia, de conhecer
seus direitos e deveres, conhecer sua história.
Todos merecemos uma
compreensão de nós mesmos enquanto seres políticos, sociais, culturais. Como
lembrou Morin, este é um dos papéis da transdisciplinaridade: “formar cidadãos
capazes de enfrentar os problemas de seu tempo”.
O
educando é um ser que está construindo sua identidade... e isto pressupõe
liberdade, autonomia. Por isso, não é possível voltar à escola de 40 anos
atrás.
Quem
ainda nutre este sonho, precisa acordar logo. Não adianta dizer: ah! No meu
tempo a escola era boa... Não era! E também não adianta dizer que melhorou:
mentira! Piorou, e muito!
A
auto-educação docente é a chave.
É
necessário e fundamental que a filosofia volte a dialogar com as ciências
particulares e estas, com a filosofia.
Por
fim, é indispensável pensar que o educador precisa ser "possuído" por
eros: deve transpirar amor à ciência que ensina e amor à pessoa para quem
ensina!
O
amor ainda é a única forma de escaparmos da armadilha de sempre pensarmos
"o outro como mero objeto para atingirmos um fim", ou ainda, apenas
como fonte de conflito, como gostava de ressaltar Sartre.
Urge
que nos auto-superemos, transcendendo nossa própria condição atual de mera
engrenagem de um sistema que mostra todos os sinais de fadiga e corrosão.
Silvio Motta Maximino -
Professor de Filosofia da Educação e Antropologia da USC
Texto publicado no dia 04/01/2009 no caderno JC Cultura, do Jornal da Cidade (Bauru)
(revisado
em julho/2011)
Caro Sílvio, você disse toda a verdade que, infelizmente ocorre em nosso país.
ResponderExcluirFico imaginando, como será o Brasil do futuro?
Com certeza, continuará dominado pelos 15% ou talvez menos da população, representado pelos 'cabeças pensantes' e que agem no silêncio para manter a 'massa humana' na ignorância através do tal 'sistema educacional brasileiro'.
Haja paciência!!!
Abraço!
Glaucia de Paula