domingo, 2 de março de 2014

Adote um marginal

27/02/14 - Tribuna do Leitor - JORNAL DA CIDADE

Adote um marginal? Já adotei!



Nos presídios federais um preso custa aproximadamente R$ 40 mil/ ano; nas universidades federais cada aluno custa, em média, apenas R$ 15 mil/ano. Nos estados o preso custa, em média, R$ 22 mil/ano; a média de investimento em alunos das redes estaduais é de apenas R$ 2,3 mil/ano. Como os dados são de 2010, pode ser que já tenham inflacionado. Ademais, não podemos esquecer que o montante gasto com cada marginal é bem maior, pois não foi considerado o custo do Poder Judiciário que o condena, do Ministério Público que o denuncia, nem o da Polícia que o investiga e prende.



Diante disso, quando alguém sugere que adotemos um marginal, vê-se logo que se trata de um lunático, pois se habitasse qualquer país civilizado da Terra, há muito teria dado conta de que já adotamos não apenas um, mas todos os marginais.

Eu, como pago caríssimo pelos marginais que adotei, não pretendo transformar a mim mesmo em marginal e sair às ruas feito um selvagem infringindo leis para caçá-los, prefiro exigir que o governo me honre e exerça sua função de pacificação social, utilizando bem os vultosos recursos que lhe entrego mensalmente para cumprir as obrigações das quais se omite, como, por exemplo, a segurança.

Perguntarão: ora, você não quer a punição dos bandidos? É claro que desejo a severa punição e repressão ao crime, mas não à custa de me tornar um miliciano ilegal, perdendo minha civilidade enquanto os responsáveis pelo estado em que nos encontramos, às risadas, pensam: “Não lembraram de nos cobrar pelo serviço que pagaram, saíram eles mesmos às ruas para executá-lo. Como são servis!”

Outros dirão: “Você pensa assim porque não foi vitimado pela violência”. Este, no entanto, não é o meu caso. Quem me conhece sabe que fui assaltado duas vezes nas ruas, minha casa foi invadida e roubada, mudei para um condomínio e ele foi assaltado três vezes, perdi meu irmão mais novo na violência gratuita do trânsito. Mesmo assim, sou contra execuções selvagens de bandidos, policiais ou quem quer que seja, pois concordo com Rui Barbosa, que dizia: “As leis que não protegem os meus inimigos, não me protegem”.

Desejo a solução do caos, mas ela não virá de assumir ilicitamente funções públicas enquanto se permite a omissão impune do Estado. Ora, sabemos que o problema vem exatamente da ausência do Estado! A saída possível é chamar as instituições às suas responsabilidades e força-las a assumir as atribuições que abandonaram. Se agir com violência civil contra a violência civil trouxesse algum resultado útil, o Rio de Janeiro seria o paraíso, haja vista a quantidade de milícias e grupos de extermínio que há tempos operam por lá.

Sim, a violência já atingiu meu patrimônio, meu corpo e meus entes queridos, mas eu ainda posso me opor a ela institucionalmente, utilizando a razão. Se porventura tivesse aderido ou apoiado algum clã selvagem de caçadores de gente, ela teria me absorvido e derradeiramente me vencido, pois teria atingido minha alma e desumanizado a minha existência (pior das condenações).

Certa feita, disseram a mim: “Seus argumentos seriam bons em um mundo perfeito”. Eu respondo, agora: se entendes que os argumentos são válidos e o mundo é que se revela falho, não desista nem perca a fé em si, não se limite a um primitivo animal predador, aja como gente e utilize a energia da caçada para transformar o mundo que te agride ao invés de se transformar também em agressor. Na sua imensa sabedoria, Ghandi disse: “Olho por olho e o mundo terminará cego”. Não deixe que te ceguem!

Luciano Olavo da Silva, analista judiciário, Bacharel em Direito, Especialista em Direito Eleitoral
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