Segue abaixo um interessantíssimo artigo de Jeff Foster, traduzido por Nando Pereira, abordando a questão de 'como' lidamos psicologicamente com as 'informações' que nos chegam como 'bombas', por meio das mídias... Como elas nos afetam e como, a partir disso, afetamos as pessoas que estão ao nosso redor?
O artigo contém uma série importante de perguntas, de
questionamentos que devemos nos fazer... questões que dizem respeito a todo ser
humano em geral e que funciona como um bom exame de consciência cidadã.
Como podemos “aceitar” o sofrimento e a insanidade do mundo?
Que vida terão as crianças?
Uma visão por Jeff Foster
O autor britânico Jeff Foster (de “Life Without a Centre” e “The Deepest Acceptance”) pediu para divulgar esse importante artigo sobre “Como Podemos Aceitar o Sofrimento do Mundo” (Keep Your Eyes On The Prize, How Can We ‘Accept’ The World’s Suffering?), originalmente publicado em maio de 2013, e agora traduzido para o português.No texto, dois pontos merecem destaque:
1) uma tomada de consciência da influência desorientadora da mídia. O 'privilégio' de receber notícias em nossas casas virou uma exposição diária ao medo e a uma visão pessimista da humanidade e do mundo.
Saber lidar com esse mundo passa, então, fundamentalmente, por perceber que essa noção de mundo talvez seja primordialmente a composição dos meios que propagam uma realidade intoxicada de lados, de “nós contra eles”, essencialmente ruim e focado no que está decadente como se fosse o predominante ou o principal.
2) a reflexão de como ensinamos nossos filhos ao reagir nós mesmos a esse mundo. Quando “embarcamos” nesse noticiário e saímos a criticar a loucura do mundo, emitindo todo tipo de julgamentos sobre bem e mal, nós mesmos passando a adotar éticas questionáveis e a transmitir táticas de sobrevivência que estão de acordo com a manutenção dessa mesma noção de mundo.
É um texto sobre o qual vale a pena refletir:
MANTENHA SEUS OLHOS NO PRÊMIO
Como Podemos ‘Aceitar’ o Sofrimento do Mundo?Por Jeff Foster (tradução Nando Pereira)
“Um homem corta outro homem até
à morte em plena luz do dia numa rua de Londres. Em Miami, um homem come o
rosto de outro homem enquanto ele ainda está vivo. Em Paris, um homem estoura
seus miolos na frente de uma dúzia de crianças arregaladas.
Essa é a hora de cantar mais
alto nossas músicas de amargura, derrota e fúria desenfreada? É a hora de
desistir? A filosofia do niilismo estava correto no fim das contas? É o mundo
um engano sem significado, uma aberração da consciência, um desperdício do tempo
de todo mundo?
Quando confrontado com
“notícias” como as acima podemos nos sentir tão fracos, tão instáveis, como se
estivéssemos vivendo num mundo que enlouqueceu e está fora de controle. Parece
que tudo é um pesadelo, como se um demônio ou alguma força negra tivesse
dominado. Alguns começam a falar da proximidade do Apocalipse. Realmente se
parece com o fim do mundo do conto de fadas que um dia nós imaginamos. De nossa
frustração e decepção, a raiva pode aparecer, a tentativa final do ego de controlar
as coisas.
No meio da devastação nós
procuramos respostas, causas, alguém ou algo a quem culpar, uma saída para toda
essa confusão, essa energia de vida não processada. Culpamos os assassinos? Os
pais deles? Toda a sociedade? O cérebro humano? A comida que comemos? Químicos?
As estrelas? Nossos governos? Religiões? Reduzimos os assassinos a loucos
doentes, desenganados e malignos? Vamos à guerra com eles como eles vieram à
guerra conosco, desejando mais morte sobre eles e seus parentes? Entramos
naquela velha história de bem versus mal, nós contra eles? Nós avançamos na
solidificação de nossa identidade com um senso de eu construído pela mente?
Nós amaldiçoamos o universo e
desejamos nunca ter nascido? Tentamos nos adormecer, nos distrair das
realidades deste mundo, com álcool, com sexo, com trabalho, com confortos
materiais? Nós simplesmente descartamos o horror, nos desligamos dos outros e
viramos nossas costas para suas condições, resmungando e reclamando de quão
“trágica” e “terrível” as coisas estão mas não fazendo nada para ajudar a
promover mudança e cura?
Nos voltamos para mestres
espirituais para nos confortar com conversas sobre a natureza ilusória da vida
e da não-realidade de tudo que vemos? Nós regurgitamos palavras como “nada
importa”, “é tudo um jogo inocente de maya” e “ninguém tem escolha mesmo”? Nós
chamamos o que vemos de “ilusão”, nos poupando da dor de ter que confrontar a
confusão e a aparente descontrole dessa manifestação relativa e impermanente?
Fingimos que os eventos do mundo não tem nada a ver conosco, que tudo está
desconectado e que somos ilhas em nós mesmos? Descemos ao solipsismo? À
anarquia? Fechamos nossos corações de maneira ainda mais forte do que ele já
está (fechado), construímos muros ainda mais altos e vivemos em um estado
protegido do medo? Desistimos deste mundo e sonhamos com uma vida perfeita após
a morte?
Nós buscamos conclusões sobre
quão bom ou mal é o universo, fixando uma visão otimista ou pessimista? Usamos
a “realidade” do noticiário como uma desculpa para desistir, para nos fechar,
para esquecermos quem realmente somos? Deixamos os “terroristas” vencerem ao
viver nós mesmos em terror, e aterrorizando os outros que classificamos como
“maus”? Nós acrescentamos problemas aos que vemos? Ou usamos a aparência dos problemas
para olhar mais profundamente para nós mesmos e ao jeito que vivemos e tratamos
os outros? Vemos a loucura como um chamado para a claridade? A violência como
um chamado para o amor? A dor como um chamado para a compaixão? O terror como
um chamado para lembrar e expressar mais profundamente e com mais convicção
aquela infinita inteligência que nós somos?
Nós perdoamos as matanças?
Absolutamente não. Sentimos a dor das vítimas e das pessoas queridas dessas
vítimas? Claro, porque não estamos separados. Faríamos tudo que
pudéssemos para evitar esse tipo de coisa de acontecer de novo? Certamente.
Trabalhos por justiça? Sim. Relaxamos e simplesmente “aceitamos”? Se a
aceitação significa desconexão e passividade, não. Se significa chegar a um
profundo alinhamento com a vida, sabendo que a mudança inteligente e a cura
sempre emergem de um mergulho no mistério do momento, então sim. A verdadeira
aceitação e a mudança criativa são amantes.
No Oriente Médio, um Judeu doa
seu rim para uma Palestina doente, salvando sua preciosa vida. Na Índia, uma
mulher alimenta e lava aqueles com lepra, porque ela vê que somos todos
expressões da mesma consciência e leva sua alegria para sua vida, apesar dos
nomes que os outros lhe chamam. Em São Francisco, um filho gay segura a mão de
seu idoso pai, e repentinamente o perdão acontece como se por mágica,
inesperadamente, o peso e a violência e o ressentimento de uma vida inteira
desaparecem, como se nunca tivessem acontecido.
Que “notícias” estamos
ensinando às nossas crianças? Estamos lhes ensinando que elas nasceram num
mundo essencialmente assustador, mau e doente, e que elas deveriam viver em
medo e ódio? Ensinamos que a violência é inevitável, que “embutida” em nossa
natureza? Ou lhes ensinamos que o assassinato e a tortura que vemos no
noticiário todos os dias brota de um profundo esquecimento de quem somos, de
uma crença falsa e desorientada de separação?
Estamos lhes ensinando a
desistir de seus sonhos porque existem pessoas más lá fora que desejam lhes
impedir? Estamos lhes ensinando a desistir do amor, a desistir da compaixão, a
desistir da mudança, a desistir da humanidade, a desistir da alegria, por causa
de todas as “notícias”? Estamos lhes ensinando a focar no que está errado com o
mundo, a se apegar ao negativo, a cantar músicas de derrota e desilusão?
Estamos lhes cegando para o “negativo” ao focá-los exclusivamente no
“positivo”? Ou estamos lhes ensinando a reconhecer a violência do mundo, a dor
dele, mas a ver que toda essa tristeza é parte de uma realidade infinitamente
maior, uma realidade onde tudo está interconectado e tudo importa e tudo está
em equilíbrio e nada está escrito em pedra?
Não use as “notícias” como uma
desculpa para parar de viver sua verdade, por um momento sequer. Não acredite
por um segundo que há uma força chamada “mal” no mundo com uma força capaz de
vencer a Vida. O terror não pode vencer, porque ele nasce de um engano
grosseiro a respeito de nossa natureza. Nós estamos apenas nos machucando, nos
esfaqueando, nos matando, e lá no fundo sabemos disso e sempre soubemos. Uma
onda nunca pode estar separada do oceano, e de nenhuma outra onda, e para além
de nossas diferenças de opinião e crença, somos todos movimentos de uma Única
Vida, da verdadeira Força, para além da força mundana das armas e de machados
pingando sangue. Ensine seus filhos as realidades do mundo, sim, mas, mais
importante que isso, ensine-os as realidades de seus corações e dos corações
daqueles que chamamos de “outros”. Deixe a onda atual de violência servir na
verdade para aprofundar nossa convicção na eterna e inatingível benção da
Presença que você sempre soube, e reconfirmar sua intenção de acabar com toda
violência em você mesmo, a viver como você sabe que pode viver. Não permita que
as “notícias”, ou ao menos as histórias selecionadas e apresentadas a você como
notícias lhes distraiam da Verdade.
Mantenha seus olhos no prêmio.”
fonte:
http://dharmalog.com/2014/02/26/aceitar-sofrimento-mundo-educacao-criancas-jeff-foster/
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