Eis uma questão básica: a vida
Uma das mais evidentes dificuldades do
ser humano é compreender o que é vida.
Cada área do saber humano, cada
fonte de conhecimento, qual filtro ou lente, arrisca, a seu modo, um conceito.
Cada
ciência particular (seja ela humana ou natural), tem sua
própria resposta. Além disso, dentro de cada ciência particular, várias teorias
coexistem com suas próprias respostas singulares.
A Religião, do mesmo modo. Cada qual, seja monoteísta, politeísta, panteísta ou animista, arrisca sua
resposta. Assim também procede a Filosofia, e a Arte.
Todos ensaiam respostas, mas nossa mente não é capaz de discernir qual a melhor,
ou pelo menos qual delas mais se aproxima da verdade. Nossa mente também nos engana. O que nos parecia um bom conceito ontem, hoje já não nos serve mais.
Para emitir um conceito que denote
real compreensão de um tema, precisamos conhecer profundamente o assunto, certo? Do contrário,
mergulhamos no vasto e nebuloso labirinto da opinião.
Se a vida pudesse ser definida a partir
de critérios fisicalistas ou materiais, poderíamos dizer se trata de um fenômeno
que anima a matéria. Assim, quando um íon modifica a composição de qualquer
composto químico, aí estaria um sinal de vida. Mas conceituar algo pela sua aparência
fenomênica, nos parece ingênuo e superficial, tal qual seria definir nosso sol
como “um círculo quente e brilhante”. Ainda que estejamos utilizando um telescópio
ou um microscópio eletrônico, o que nos garante que estamos de fato observando
a vida, e não apenas um fenômeno provocado por ela?
A Biologia debate
se a vida implica em ter ou não ter células. Fosse assim, vírus e príons não seriam
formas de vida, pois são desprovidos de células. O vírus, dizem, é uma
estrutura à base de proteínas, cujo interior apresenta alguns filamentos de DNA
ou RNA, contendo aquelas informações essenciais para sua replicação, que ocorre
somente quando encontra o ambiente adequado, dentro de outra certa célula
hospedeira. Já os príons nem DNA ou
RNA possuem. Bem menores que os vírus, são proteínas que conseguem desorganizar
o metabolismo da célula hospedeira, cansando-lhe finalmente à morte. Poderiam ou
não ser considerados formas vitais?
Bom... o ser
humano também possui DNA e RNA, e tampouco sobrevive fora do organismo vivo que
é o planeta. Antes, modifica e é capaz de destruir seu próprio ecossistema pela
reprodução descontrolada e depredação indiscriminada do meio que o cerca...
comportamento muito similar aos temíveis vírus e príons.
Não, nenhum critério,
científico ou não, explica o que é a vida ou os seus limites. O movimento também
indica a presença de vida, mas tampouco encerra seu significado. Como há
movimento em qualquer átomo, seja ele componente do ar ou da pedra, então isso
já é suficiente para sabermos que, com maior ou menor evidência, a vida permeia
realmente tudo que há, indistintamente. Simplesmente não há morte em sentido absoluto.
Apenas movimento e, consequentemente, transformação, renovação... e mais vida,
sempre. Os próprios buracos negros, tidos como regiões siderais inóspitas e
caóticas, hoje já se sabe, são berço de novas estrelas e novos mundos.
A mesma vida
‘sabe’ os meios de infinitamente se perpetuar, em infinitas formas... Encontra até
os meios de produzir o pensar, o sentir e o sonhar. Mais um pouco e ela aprende
a pensar-se, como estamos nós a fazer nesse exato momento em que eu aqui escrevo
e você aí me lê!
Então essa
mesma vida, vejam só, aprendeu a se autocontemplar, a partir do espelho da autoconsciência...
outro mistério!
Mas o que/quem
a ensinou? Como a vida aprende? Sendo o movimento, sinal inequívoco da vida, o
que o teria gerado primordialmente? A vida move-se por si mesma? Ou seria Deus
que a move? Mas, que é Deus, senão algo/alguém indefinível que tampouco
conhecemos, exceto por meio de fenômenos naturais? Deus e vida são sinônimos? Ambos
incompreensíveis em seus insondáveis desígnios, incomensuráveis, onipresentes. A
única certeza? nossa ignorância.
A Metafísica
também se pergunta sobre o porquê da vida. Por que o ser humano? Por que as imperfeições,
as misérias morais e materiais?
Seja no campo da Arte, da Ciência, da Religião ou da Filosofia, a vida se
admira, se perscruta, se comove, se conscientiza de si, em infinitas, terríveis
e magníficas formas.
Só a vida em si mesma permanece, enquanto a
forma eternamente se desvanece.
Essa mesma impermanência abençoa com igual cuidado, tanto a estrela mais brilhante e distante, quanto o mais íntimo pensamento ou sentimento. A vida é aparente movimento, mas também aparente solidez e quietude.
Impermanência e eternidade: eis o paradoxo da vida.
Impermanência e eternidade: eis o paradoxo da vida.
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