"Metade dos documentos de posse de terra no Brasil é ilegal"
A
afirmação é do geógrafo Ariovaldo Umbelino, para quem o programa Terra
Legal permitirá que terras do patrimônio público ocupadas ilegalmente se
transformem em propriedade privada
Por Marcella Lourenzetto
geógrafo, pesquisador e professor da USP Ariovaldo Umbelino fala
sobre a situação de propriedades que utilizam terras retiradas do
patrimônio público ilegalmente, os famosos casos de grilagem, e também
se diz contrário ao programa “Terra Legal” do Governo Federal.
“Nós temos no Brasil hoje um numero elevadíssimo de escrituras onde
não há fazendas”, comenta o geógrafo. Ele explica que no país existe um
número alto de fraudes na documentação de terras, principalmente em
municípios com importância econômica, como em São Félix do Xingu, no
Pará, que possui o segundo maior rebanho de carne bovina do país.
No começo de 2012, o geógrafo integrou um grupo que realizou um
comparativo entre o processo de retomada das terras devolutas do portal
do Paranapanema, em São Paulo, com o que estava acontecendo em São Félix
do Xingu. Advogados da Faculdade de Direito do Pará também participaram
do projeto e o pesquisador liderou a equipe que foi a campo analisar a
situação da região.
“Nós verificamos que, na realidade, praticamente 100% dos documentos
legais do cartório têm que ser anulados, porque são falsos. A
corregedoria do Pará anulou todas as escrituras registradas no cartório
de registro de imóveis de São Félix do Xingu”, afirma. E também indaga:
“Ninguém é dono das terras mais. Bem, dono do papel. Mas quem está lá na
fazenda hoje?”.
Umbelino alerta que o problema não é uma situação isolada ao norte do
Brasil. Atualmente ele enfrenta a mesma realidade em outros estados do
país. “Isso tem em todos os municípios do Brasil. Estou fazendo esse
trabalho lá em Minas Gerais, em Riacho dos Machados, é a mesma coisa.
Metade dos documentos é ilegal”, afirma.
Programa Terra Legal
O programa é uma iniciativa do Ministério de Desenvolvimento Agrário
que visa promover a regularização fundiária de ocupações em terras
públicas federais situadas na Amazônia Legal. Teve início em 2009,
durante o governo Lula e, de acordo com o Governo Federal, a meta se
baseia em legalizar as terras ocupadas por cerca de 300 mil posseiros.
Com o projeto, o governo também busca reduzir o desmatamento, ampliar as
ações de desenvolvimento de forma sustentável na região e reduzir os
casos de grilagem.
Entretanto, para o geógrafo, não é bem isso o que acontece. Ariovaldo
acredita que as medidas provisórias propostas pelo ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, que autorizam a doação de porções de terras
públicas e aceleram os processos de regularização das propriedades,
permitem a legalização de mil e quinhentos hectares. Para ele, isso é um
ato inconstitucional e que também contribui na legalização dos grilos.
“O direito a legitimação de posse só pode ser feito para cinquenta
hectares. Como eu elevo para mil e quinhentos? Estou ferindo a
Constituição”, diz.
Ele ainda afirma que há formas de burlar a lei: “Coloco mil e
quinhentos no nome de um filho, depois mil e quinhentos no nome de outra
filha, e legalizo dez mil, vinte mil hectares”. Umbelino defende que há
o princípio baseado na ilegalidade e outro baseado na justiça social.
“Quem tem terra não tem que ter mais terra”, conclui.
Fonte: Carta Capital.
https://www.portaldomeioambiente.org.br/editorias/sociedade/meio-ambiente-rural/7140-metade-dos-documentos-de-posse-de-terra-no-brasil-e-ilegal
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