Sobre a Análise do Discurso
Maria Alice Siqueira Mendes e Silva
FATEC, Ourinhos, SP.
(Mestre em Psicologia pela UNESP/Assis e docente do curso de Análise de Sistemas e Tecnologias da Informação da FATEC de Ourinhos)
Revista de Psicologia da UNESP, 2005
Resumo: Este artigo tem por objetivo demonstrar o modo como a Análise do Discurso foi se configurando, historicamente, como um campo teoricometodológico que fornece subsídios para a análise de discursos. Norteando-se pelas concepções de Orlandi (1996,1999), Brandão (1986) e Fiorin (1994), destacam-se as principais contribuições do Marxismo, da Psicanálise e da Linguística para esse campo do saber. Ficou demonstrada a contribuição da Análise do Discurso como um instrumento técnico, tanto das pesquisas em Psicologia, como das diversas áreas do conhecimento.
Palavras-chave: Análise do Discurso; Marxismo; Psicanálise; Lingüística
Etimologicamente a palavra discurso contém em si a idéia de percurso, de correr por, de movimento. O objeto da Análise do Discurso é o discurso, ou seja, ela se interessa por estudar a “língua funcionando para a produção de sentidos”. Isto permite analisar unidades além da frase, ou seja, o texto. (Orlandi, 1999, p.17) A Análise do Discurso considera que a linguagem não é transparente e procura detectar, então, num texto, como ele significa. Ela o vê como detentor de uma materialidade simbólica própria e significativa. Portanto, com o estudo do discurso, pretende-se apreender a prática da linguagem, ou seja, o homem falando, além de procurar compreender a língua enquanto trabalho simbólico que faz e dá sentido, constitui o homem e sua história. Por meio da linguagem, o homem transforma a realidade em que vive e a si mesmo. O homem constrói a existência humana, ou seja, confere-lhe sentido. E é essa capacidade do homem de atribuir, incessantemente, sentidos que promove seu constante devir, e o das coisas, que interessa à Análise do Discurso.
A Análise do Discurso leva em conta o homem e a língua em suas concretudes, não enquanto sistemas abstratos. Ou seja, considera os processos e as condições por meio dos quais se produz a linguagem. Assim fazendo, insere o homem e a linguagem à sua exterioridade, à sua historicidade.
Para visualizar o homem e seu discurso como influenciador/influenciado por sua história, este campo teórico articula conhecimentos dos campos das Ciências Sociais e do domínio da Lingüística, buscando transcendê-los e deslocá-los de seus lugares de saber, forçando-os a refletir sobre “[...] o sentido dimensionado no tempo e no espaço das práticas do homem” (Orlandi, 1999, p. 16). Ao fazê-lo, a Análise do Discurso relativiza a autonomia do objeto da Lingüística, ou seja, a língua como sistema abstrato, fechada nela mesma e impõe-lhe a “idéia” de discurso, que é um objeto sociohistórico e no qual está implícita a intervenção do lingüístico. Tampouco considera a história e a
sociedade (objeto das Ciências Sociais) como independentes de suas significações, isto é, como se não tivessem perpassadas pela linguagem. Desta forma, a Análise do Discurso busca conceber como a linguagem se materializa na ideologia e como esta última se manifesta na língua. Dito de outra forma, a Análise do Discurso busca apreender como a ideologia se materializa no discurso e como o discurso se materializa
na língua, de modo a entender como o sujeito, atravessado pela ideologia de seu tempo, de seu lugar social, lança mão da língua para significar(-se).
Como a Análise do Discurso inscreve-se em um quadro que articula o lingüístico com o social e, ainda, devido à polissemia de que se investe o termo “discurso”, ela vê seu campo estender-se para outras áreas do conhecimento. Em busca de definir seu campo de atuação, "[...] toma a linguagem como um fenômeno que deve ser estudado não só em relação ao seu sistema interno, enquanto formação lingüística a exigir de seus usuários uma competência específica, mas também enquanto formação ideológica, que se manifesta através de uma competência sócio-ideológica [...]” (Brandão, 1986, p. 18).
Disto, dois conceitos tornam-se nucleares: o de ideologia (tal como proposto por Althusser em seu trabalho sobre os Aparelhos Ideológicos de Estado) e o de discurso (tal como proposto por Foucault em Arqueologia do Saber, de onde extraíra a expressão ‘formação discursiva’, para submetê-la a uma noção específica à Análise do Discurso). Sobre tais conceitos, falaremos mais adiante.
Histórico da Análise do Discurso
Para delinearmos a trajetória histórica da Análise do Discurso, utilizaremos dados baseados em Orlandi (1999) e Brandão (1986). De acordo com Orlandi, o estudo do objeto da Análise de Discurso, a saber, o discurso, já se apresentara de forma não sistemática em diferentes épocas e segundo diferentes sentidos. Sem considerar os estudos retóricos da Antigüidade, cita estudos de textos realizados por M. Bréal, no século XIX. Já no século XX, aponta os estudos dos formalistas russos, nos anos 20 e 30, como prenunciadores de uma análise diferente da tradicional na época, a análise de conteúdo, uma vez que já se perguntavam como o texto significa (da mesma forma que a Análise do Discurso) em vez de perguntarem o quê significa. Brandão (1986, p.15), que concorda com esta colocação de Orlandi, sugere, ainda, que esta abertura em direção ao discurso não chegou às últimas conseqüências, que neste caso, seria uma análise do texto, segundo a abordagem da Análise do Discurso, porque os estruturalistas limitaram-se a estudar a estrutura do texto nele mesmo e por ele mesmo, desconsiderando, portanto, sua exterioridade.
Os anos 50, ainda segundo Brandão, foram decisivos para a constituição da Análise do Discurso enquanto disciplina. Tanto Brandão quanto Orlandi (1999) citam Z. Conceito que será, posteriormente, abordado neste trabalho.
Para a Análise do Discurso, é o processo que desloca o ‘mesmo’ e aponta para a ruptura, para a criatividade. Representa o diferente. É ‘fonte de sentido’ (ORLANDI, 1996). Brandão coloca que a polissemia rompe com as fronteiras da paráfrase, instalando a pluralidade, a multiplicidade. (1986, p.39). Harris – com seu método distribucional, o qual “consegue livrar a análise do texto do viés conteudista (Brandão, 1986, p.15), apesar de reduzi-lo a uma frase longa – como teórico que mostrou “[...] a possibilidade de ultrapassar as análises confinadas meramente à frase” (Brandão, p.15) ao estender procedimentos da lingüística aos enunciados (discursos). A obra de Harris acaba por torna-se limitada à Análise do Discurso porque não foi capaz de refletir sobre a significação e as considerações sociohistóricas.
Brandão cita, ainda, os trabalhos de R. Jakobson e E. Benveniste sobre a enunciação4. Este último enfatiza o papel do sujeito falante no processo da enunciação e como ele se inscreve nos enunciados que emite. Assim, Benveniste contribui para a questão da relação entre locutor, seu enunciado e o mundo, relação esta que estará no cerne das reflexões da Análise do Discurso.
Segundo Orlandi (1986), citada por Brandão (1986, p.16), essas duas direções marcarão duas maneiras diferentes de pensar a teoria do discurso: Uma que a entende como uma extensão da Lingüística (perspectiva americana) e outra que considera o enveredar para a vertente do discurso, o sintoma de uma crise interna da Lingüística, principalmente na área da Semântica (perspectiva européia).
Conforme a visão americana, encara-se o texto de uma forma redutora, ou seja, não se leva em consideração as formas de instituição do sentido e, sim, a forma como os elementos que o constituem se organizam. Não há, portanto, uma ruptura fundamental.
Apesar de a Sociolingüística observar o uso atual da linguagem, de a Pragmática propor que a linguagem em uso deva ser estudada em termos de atos de fala, e de isso indicar mudança, tais contribuições não conseguem desencadear um rompimento maior.
Contrapondo-se a essa concepção, a perspectiva européia, “partindo de ‘uma relação necessária entre o dizer e as condições de produção desse dizer’ coloca a exterioridade como marca fundamental.” (Orlandi, 1986, citado por Brandão, 1986, p.16). Orlandi (1999) faz referência, ainda, a M. A. K. Halliday, do estruturalismo europeu. Segundo ela, este teórico inverte a perspectiva lingüística quando trata o texto como unidade semântica, mas acaba estacionando suas contribuições por não considerar a ideologia como constitutiva do texto.
Ao extrapolar o domínio da Lingüística, ou seja, ao recorrer a conceitos exteriores à Lingüística, a Análise do Discurso provoca um deslocamento teórico que exigirá filiações a outras correntes teóricas. Desta forma, surge nos anos 60, tendo como base a interdisciplinaridade entre três domínios disciplinares: a Lingüística, o Marxismo e a Psicanálise, apesar de a todo instante deslocar, ou seja, questionar tais saberes.4 Este conceito será elucidado, posteriormente, neste trabalho.
A contribuição da Lingüística para a Análise do Discurso
A Lingüística se apresenta como o pano de fundo a partir do qual emerge a Análise do Discurso. Seus conceitos servem de referenciais para esta teoria, ainda que o movimento desta ora incorpore o conhecimento da Lingüística, ora o questione e, principalmente, ora o deixe de lado. A Lingüística funciona como uma estrutura na qual e por meio da qual a Análise do Discurso se configura enquanto processo e movimento.
A contribuição do Marxismo para a Análise do Discurso Sobre o conceito de ideologia
O termo ideologia é matizado por diferentes nuances significativas. Disto decorrem muitas controvérsias a seu respeito. Segundo Chauí (citada por Brandão, 1968, p.19), [...] o termo ‘ideologia’, criado pelo filósofo Destutt de Tracy, em 1810, na obra Elements de Idéologie, nasceu como sinônimo da atividade científica que procurava analisar a faculdade de pensar, tratando as idéias como fenômenos naturais que exprimem a relação do corpo humano, enquanto organismo vivo, com o meio ambiente.
Entendida como ciência positiva do espírito, ela se opunha à Metafísica, à Teologia, à Psicologia, pela exatidão e rigor científicos que se propunham como método. Foi com Napoleão que a ideologia passa a ser vista como perigosa para a ordem estabelecida, que esse termo passa a ter um significado pejorativo, pela primeira vez, ao acusar os ideólogos franceses de ‘... abstratos, nebulosos, idealistas e
perigosos (para o poder) por causa do seu desconhecimento dos problemas concretos’. (Reboul, citado por Brandão, 1986, p.19).
Conforme observamos no item Sobre a Análise do Discurso, o conceito de ideologia contemplado pela Análise de Discurso deriva do trabalho de Althusser sobre os Aparelhos Ideológicos do Estado. Este, porém, se apropria de tal conceito instituído por Marx, cuja obra nos remeteremos a partir de agora.
Marx e Engels também impregnaram esse termo de um sentido negativo. Para eles, a ideologia separa a produção de idéias das condições sociohistóricas em que são produzidas. Por isso, baseiam suas formulações em verificação empírica, pois os dados da realidade são “[...] os indivíduos reais, sua ação e suas condições materiais de existência, aquelas que já encontraram à sua espera e aquelas que surgem com a própria ação” (Marx, citado por Brandão, 1986, p.20). Desta forma, a observação empírica deveria mostrar empiricamente e realisticamente a ligação entre a estrutura social, a política e a produção, dado que a produção de idéias, de concepções e da consciência estaria intimamente vinculada à atividade e ao comércio de idéias, dos homens, do mesmo modo como daí derivaria uma linguagem da vida real.
Ainda segundo esses autores, as ideologias levam os homens e suas relações a ficarem de cabeça para baixo. É no momento que o sistema de idéias e das normas e regras aparece como algo independente das condições materiais, uma vez que seus produtores – os teóricos, os intelectuais – não estão diretamente vinculados à produção material das condições de existência, que nasce a ideologia. Imperceptivelmente, esses produtores exprimem essa desvinculação por meio de suas idéias, as quais, gerando a separação entre trabalho intelectual e trabalho material, possibilitam que as idéias pertencentes ao primeiro grupo sejam a expressão da classe dominante. E, por pertencerem à mesma, dominam e determinam todo o âmbito de uma época histórica em toda sua extensão, regulando a produção e distribuição de idéias de seu tempo.
Chauí (1980, citada por Brandão, 1986), ainda nos coloca que, a concepção marxista de ideologia supõe que a mesma É um instrumento de dominação de classe porque a classe dominante faz com que suas idéias passem a ser idéias de todos. Para isso eliminam-se as contradições entre força de produção, relações sociais e consciência, resultantes da divisão social do trabalho material e intelectual. Necessária à dominação de classe, a ideologia é ilusão, i. é, abstração e inversão da realidade e por isso permanece sempre no plano imediato do aparecer social [...]. O aparecer social é o modo de ser do social de pontacabeça.
A aparência social não é algo falso e errado, mas é o modo como o processo social aparece para a consciência direta dos homens. Isto significa que uma ideologia sempre possui uma base real, só que essa base está de ponta-cabeça, é a aparência social. (p.105).
Para dar estatuto de realidade a essa visão ilusória da realidade, a ideologia organiza-se “[...] como um sistema lógico e coerente de representações (idéias e valores) e de normas ou regras (de condutas) que indicam e prescrevem aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem pensar, o que devem valorizar, o que devem sentir, o que devem fazer e como devem fazer” (Chauí, 1980, citada por Brandão, 1986, p.20). Desta forma, a ideologia se apresenta, simultaneamente, como explicação teórica – que não explica porque corre o risco de destruir a si própria – e, também, como prática (dita as regras de conduta).
O termo ideologia, em Marx, foi decisivo para a construção de sua teoria, a qual se tratava de uma crítica ao sistema capitalista e ao desnudamento da ideologia burguesa. Devemos, portanto, situá-lo dentro do quadro específico ao qual pertence, que é o da ideologia da classe dominante.
Althusser, em Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado (1970), afirma que, para perpetuar sua dominação, a classe dominante cria meios de reprodução das condições materiais, ideológicas e políticas de exploração. Entra aí o papel do Estado que, por intermédio de seus Aparelhos Repressores (Governo, Administração, Exército, polícia, tribunais, prisões) e Aparelhos Ideológicos (instituições como escola, igreja, família, Direito, política, sindicato, cultura, informação) intervém ou pela repressão ou pela ideologia, a fim de submeter a classe dominada às relações e condições de
exploração.
Em uma segunda parte de seu trabalho, Althusser (1970) retoma as indagações sobre o conceito de ideologia de modo generalizado, que seria “[...] a abstração dos elementos comuns de qualquer ideologia concreta, a fixação teórica do mecanismo geral de qualquer ideologia” (p. 12).
Para explicar tal concepção, formula três hipóteses:
a) “A ideologia representa a relação imaginária de indivíduos com suas reais condições de existência.”
Com esta tese, Althusser coloca que a relação indivíduo/condições reais de existência é necessariamente imaginária, uma vez que o homem representa simbolicamente sua relação com a realidade. Essa simbolização supõe um distanciamento do real, o qual pode contribuir para a deformação imaginária desta realidade, ou seja, para a alienação do homem.
b) “[...] a ideologia tem uma existência porque existe sempre num aparelho e na sua prática ou suas práticas.”
Para Althusser, “O comportamento [material] de ‘um sujeito dotado de uma consciência em que forma livremente, ou reconhece livremente, as idéias em que crê’, decorre naturalmente dessas idéias que constituem a sua crença . . .” (Brandão, 1986, p. 22). Entretanto, “essas idéias deixam de ter uma existência ideal, espiritual, e ganham materialidade na medida em que sua existência só é possível no seio de ‘um aparelho ideológico material que prescreve práticas materiais governadas por um ritual material, práticas que existem nas ações materiais de um sujeito’.”(Mc Lennan et al., citado por
Brandão, 1986, p. 23).
Assim, a ideologia se materializa nos atos concretos, moldando as ações. Disso conclui Althusser que, a prática só existe em uma e por meio de uma ideologia.
c) “A ideologia interpela indivíduos como sujeitos."
A ideologia constitui indivíduos concretos em sujeitos. Mediante mecanismos de interpelação e de (re)conhecimento do indivíduo, a ideologia transforma-o em sujeito.
“O reconhecimento se dá no momento em que o sujeito se insere, a si mesmo e as suas ações, em práticas reguladas pelos aparelhos ideológicos. Como categoria constitutiva da ideologia será somente através do sujeito e no sujeito que a existência da ideologia será possível.” (Brandão, 1986, p.24)
Paul Ricoeur, sem concordar ou discordar de Marx, nos alerta para o fato de o fenômeno ideológico ser fortemente marcado pelo marxismo. Desta forma, atenta-nos para o fato de que a interpretação de tal fenômeno, atrelada a uma análise em termos de classes sociais, corre o risco de reduzir tal fenômeno, o que pode nos levar a aceitar acriticamente, a identificação de ideologia com as noções de erro, mentira e ilusão.
Além de considerar tal faceta, diz ser necessário entender uma função anterior e básica referente à ideologia em geral. Sua análise contempla três instâncias:
a) Função Geral da ideologia: ela é mediadora na integração social, na coesão do grupo. Esta função se caracteriza pela presença de cinco traços:
1. “A ideologia perpetua um ato fundador inicial. Tal perpetuação está ligada à necessidade do próprio grupo de obter uma imagem, uma representação de si mesmo.
Nesse sentido, é ‘função da distância que separa a memória social de um acontecimento que, no entanto, trata-se de repetir. Seu papel não é somente o de difundir a convicção para além do círculo dos pais fundadores, para convertê-la num credo de todo o grupo, mas também o de perpetuar a energia inicial para além do período de efervescência.”(Ricoeur, citado por Brandão, 1986, p.24).
2. A ideologia é dinâmica e motivadora, impulsiona uma práxis social que a concretiza. Antes de ser apenas um reflexo de uma formação social, ela é justificação [porque movida pelo desejo de demonstrar que o grupo que a professa tem razão de ser o que é] (Brandão, 1986, p.25) e projeto, uma vez que dita as regras de um modo de vida.
3. Toda ideologia é simplificadora e esquemática. Ela apresenta um caráter codificado para se dar uma visão de conjunto, de história, de mundo. Visando à eficácia de suas idéias, ela é racionalizadora, e se expressa por meio de máximas, slogans e formas lapidares em que a retórica está sempre presente.
4. A ideologia é operatória e não temática. Isto é, “[...] ela opera atrás de nós, mais do que a possuímos como um tema diante de nossos olhos. É a partir dela que pensamos, mais do que podemos pensar sobre ela.” (Brandão, 1986, p.25) É devido a esse estatuto não-reflexivo e não-transparente da ideologia que se vinculou a ela a noção de dissimulação, de distorção (Brandão, p. 25).
5. Poderíamos dizer que a ideologia é intolerante devido à inércia temporal que parece caracterizá-la. Assim, a ideologia apresenta-se como conservação e resistência às mudanças, visto que essas põem em risco a ordem estabelecida pela mesma. Deste modo, propõe que os membros de um grupo se reconheçam pela comunhão das mesmas idéias e práticas sociais, operando, assim, um estreitamento das possibilidades de interpretação dos acontecimentos. Ela se sedimenta enquanto os fatos e as situações se transformam, o que pode causar um “enclausuramento ideológico e até mesmo a cegueira ideológica” (Brandão, 1986, p.25).
b) Função de dominação: diz respeito aos aspectos hierárquicos da organização social cujo sistema de autoridade interpreta e justifica. Toda autoridade, para legitimar-se, precisa de indivíduos que acreditem na legitimidade desta autoridade. A ideologia surge como um necessário sistema justificador da dominação, porque somente pela crença dos mesmos não seria possível tal legitimação.
No cruzamento da ideologia-integração com a ideologia-dominação emerge o caráter dissimulador da ideologia. Mas não podemos considerar que todos os traços atribuídos a seu papel mediador passem à função dissimuladora, como se costuma fazer. A função de deformação é a que, segundo Ricoeur, adquire a noção marxista propriamente dita e que supõe as duas outras analisadas anteriormente. Para esse autor,
é básico, na ideologia, sua função mediadora incorporada ao vínculo social: “a ideologia é um fenômeno insuperável da existência social, na medida em que a realidade social sempre possuiu uma constituição simbólica e comporta uma interpretação, em imagens e representações, do próprio vínculo social.” (Ricoeur, citado por Brandão, 1986, p. 25).
Vimos com Ricouer que, na primeira função da ideologia (função geral), esse termo não tem caráter negativo: “Esse sentido negativo aparecerá [e se fixará definitivamente com o marxismo] quando o fenômeno se cristalizar em face do problema da autoridade que, acionando o sistema justificativo da dominação, detona o caráter de distorção e de dissimulação da ideologia.” (Brandão, 1986, p.26) Essas diferentes maneiras de conceber a ideologia provocam diferentes modos de abordar a relação linguagem-ideologia.
A tradição marxista, que entende a ideologia como o mecanismo que deforma a realidade, apresenta a suposição de um discurso ideológico que serve para legitimar e reproduzir o poder da classe dominante.
Por outro lado, temos uma noção de ideologia, não tão restrita como no marxismo. A ideologia é vista aqui de maneira mais ampla, entendida como uma visão de mundo de uma determinada comunidade social, dada num determinado tempo histórico. Esta noção compreende a relação linguagem e ideologia como estreitamente vinculada e necessária, uma vez que é na e por meio da linguagem que a ideologia se materializa.
Nesse sentido, todos os discursos são ideológicos. Porém, não no sentido de “falsa consciência”, dissimulação ou mascaramento, mas no sentido de que a ideologia é/está inerente ao signo, que por ter um caráter arbitrário, permite que a linguagem ora leve à criação, à produtividade de sentido, ora leve à manipulação da construção da referência.
Esses dois lados da ideologia, ao invés de se excluírem, se coadunam, pois, enquanto concepção de mundo, a ideologia apresenta-se como uma forma verdadeira de pensar o mundo. Isso não quer dizer que ela seja compatível com a realidade, dado seu caráter imaginário e inconsciente, mas que, por outro lado, ela (ideologia) pode ser produzida intencionalmente, conscientemente, como por exemplo, nos discursos institucionalizados. Nesse ponto, as duas concepções de ideologia se convergem, porque mesmo um discurso que faça um recorte da realidade e, assim, omita ou falseie alguns dados da realidade, nem por isso deixará de ser uma visão de mundo.
A contribuição de Foucault para a Análise do Discurso
Sobre o conceito de discurso Para Foucault (1969), o discurso é uma dispersão, visto que, não estão ligados por nenhum princípio de unidade. Somente por meio das regras de formação5 seria possível determinar os elementos que compõem o discurso, a saber:
a) os objetos que aparecem, coexistem e se transformam num “espaço comum” discursivo;
b) os diferentes tipos de enunciação6 que podem permear o discurso;
c) os conceitos em suas formas de aparecimento e transformação em um campo discursivo, relacionados em um sistema comum;
d) os temas e teorias, isto é, “[...] o sistema de relações entre diversas estratégias capazes de dar conta de uma formação discursiva, permitindo ou excluindo certos temas ou teorias.” (Brandão, 1986, p.28).
Em outras palavras, essas regras que determinam uma formação discursiva7 são vistas como um sistema de relações entre objetos, tipos enunciativos, conceitos e estratégias. São elas que conferem singularidade às formações discursivas e que possibilitam a passagem da dispersão para a regularidade, que é atingida pela análise e descrição dos enunciados de tais formações.
Foucault define o discurso como “[...] um conjunto de enunciados que tem seus princípios de regularidade em uma mesma formação discursiva.” (Brandão, 1986, p.28) Para ele, o enunciado é a unidade elementar que constitui um discurso e que possui quatro características:
5 Regras capazes de reger a formação dos discursos que, segundo Foucault, deveriam ser estabelecidas pela Análise do Discurso.
6 Emissão de um conjunto de signos que é produto da interação de indivíduos socialmente organizados. A enunciação se dá num aqui e agora, jamais se repetindo. Ela é marcada pela singularidade.
7 Conjunto de enunciados marcados pelas mesmas regularidades, pelas mesmas “regras de formação”. A formação discursiva se define pela sua relação com a formação ideológica.
a) Diz respeito à relação do enunciado com o referencial:8 Conforme Machado, citado por Brandão (1986, p.29), é o enunciado que relaciona as frases com um campo de objetos, possibilitando que elas apareçam como conteúdos concretos no tempo e no espaço.
b) Diz respeito à relação do enunciado com seu sujeito: Foucault critica a concepção de sujeito enquanto instância fundadora da linguagem, que vê a história como um processo contínuo, sem rupturas. Para ele, considerar o sujeito como tal, elimina a realidade do discurso.
O sujeito fundador [...] está encarregado de animar diretamente ‘com seu modo de ver as formas vazias da língua; é ele que, atravessando a espessura ou a inércia das coisas vazias, retoma intuitivamente, o sentido que aí se encontra depositado, é ele igualmente que, para além do tempo, funda horizontes de significações que a história não terá, em seguida, senão que explicitar e onde as proposições, as ciências, os conjuntos dedutivos encontrarão enfim seu fundamento. Em sua relação com o
sentido, o sujeito fundador dispõe de signos, de marcas, de traços, de letras. Mas não tem necessidade, para os manifestar, de passar pela instância singular do discurso (Foucault, citado por Brandão, 1986, p.29).
Foucault atribui à instância singular do discurso um estatuto privilegiado. Para ele, “[...] descrever uma formulação enquanto enunciado não consiste em analisar as relações entre autor e o que ele diz (ou quis dizer, ou disse sem querer); mas em determinar qual é a posição que podem e deve ocupar todo indivíduo para ser seu sujeito.” (Foucault, citado por Brandão, 1986, p.29-30).
Ao fazer estas colocações, Foucault propõe que o sujeito seja uma função, um espaço vazio que pode ser preenchido por diferentes indivíduos ao formularem um enunciado. Não há uma concepção unificante do sujeito. Ao contrário, é esta possibilidade de dispersão do mesmo, esta última decorrente das várias posições possíveis de serem assumidas por ele no discurso, que atravessa o discurso. E é esta possibilidade de dispersão que permite que o sujeito assuma, no interior do discurso, lugares e estatutos diferentes.
Portanto, para esse autor, o sujeito não é a causa, a origem do fenômeno linguagem, mas as diversas possibilidades de subjetividade que ele pode manifestar.
Esta característica contribui de modo significativo para a Análise do Discurso.(Brandão, 1986, p.28).
c) Diz respeito à existência de um domínio ou espaço colateral associado aoe enunciado, de maneira que o integra a outros enunciados:
Para Foucault não existe enunciado independente, este está sempre integrado em um jogo enunciativo.
d) Diz respeito à emergência do enunciado como objeto, ou seja, como matéria: 8 Aquilo que o enunciado enuncia.
Para explicitar essa idéia, Foucault distingue enunciado e enunciação. Segundo ele, a enunciação se dá toda vez que alguém emite um conjunto de signos; portanto, é singular, pois jamais se repete; ao contrário do enunciado que pode ser repetido. Teoricamente, um mesmo enunciado pode ter diversas enunciações, dependendo de sua localização em um campo institucional. Por exemplo, uma frase, inserida num romance ou em um texto policial, jamais será o mesmo enunciado, uma vez que possuirá em cada um desses espaços, uma função enunciativa diferente.
Apesar de ter contribuído fecundamente para a Análise do Discurso, ao formular algumas de suas diretrizes, Foucault deixa essa tarefa para ser completada pelos lingüistas. Dentre suas principais contribuições para este campo de estudo, podemos resumir:
a) A concepção de discurso considerado como prática que provém dos saberes, e a necessidade de articulá-lo com outras práticas não discursivas.
b) O conceito de formação discursiva.
c) A distinção entre enunciação e enunciado.
d) A concepção de discurso como jogo estratégico e polêmico, como luta.
e) A concepção de que o discurso é o espaço no qual saber e poder se articulam.
f) A concepção de que o discurso, como gerador de poder, seleciona, organiza e redistribui certos procedimentos que garantem a estabilidade de seu poder.
A contribuição de Pêcheux para a Análise do Discurso
Com o objetivo de articular a concepção de discurso de Foucault e a teoria materialista do discurso, Pêcheux e Fucks (citado por Brandão, 1986, p. 32) preconizam um quadro epistemológico geral da Análise do Discurso, que engloba três regiões do conhecimento:
1. O materialismo histórico como teoria das formações sociais e suas transformações;
2. A lingüística, como teoria dos mecanismos sintáticos e dos processos de enunciação;
3. A teoria do discurso, como a teoria da determinação histórica dos processos semânticos.
Esses três domínios disciplinares estão, de certo modo, atravessados por uma teoria da subjetividade de natureza psicanalítica.
Pêcheux, ao elaborar os princípios para uma teoria materialista do discurso, parte de dois pontos de vista: 1º) que a semântica não é parte da lingüística, mas constitui seu ponto nodal; 2º) que é justamente neste ponto nodal (semântica) que a lingüística confina com a filosofia e com o materialismo histórico.
A concepção desse cruzamento entre a filosofia materialista e a lingüística levou esta última a revisar seus próprios objetos e questionar sua relação com a ciência das formações sociais. Pêcheux coloca, então, duas noções fundamentais e contraditórias:
a) A noção de base lingüística, que compreende todo sistema lingüístico enquanto conjunto de estruturas fonológicas, morfológicas e sintáxicas, o qual é regido por leis internas e, portanto, possui uma autonomia relativa.
b) A noção de processo discursivo-ideológico que se desenvolve sobre a base dessas leis internas, rejeitando a idéia de discursividade enquanto utilização “acidental” dos sistemas lingüísticos.
Com base em estudos foucaultianos, Pêcheux elabora o conceito de processo discursivo cuja proposta consiste em inscrever tal processo em uma relação ideológica de classes, pois reconhece que, se por um lado, a língua mantém uma relativa autonomia frente às diferenças de classes sociais, por outro, tais classes se apropriam, de modo diferente, da língua.
A partir dessa distinção fundamental, esse autor propõe que: a) A língua constitui a condição da possibilidade do discurso, visto que é invariante em todas as condições de produção em um dado momento histórico;
b) Os processos discursivos constituem a fonte de produção dos efeitos de sentido, e a língua é o lugar material em que tais efeitos se concretizam.
Assim, se é no processo discursivo que se constitui o sentido, é no e por meio do discurso que emergem as significações. A noção de formação discursiva, juntamente com as de condição de produção e formação ideológica, fundamentaram os princípios teóricos da Análise do Discurso.
Conceitos que, a partir de agora, elucidaremos de forma breve.
A noção de condições de produção do discurso Brandão (1986, p.35-36) descreve um breve esboço que Courtine fez sobre a origem da noção de condições de produção. Porém, segundo esta autora, foi Pêcheux quem propôs a primeira definição empírica geral da noção de condições de produção, inscrevendo esta noção no esquema informacional da comunicação, elaborado por Jakobson. Esquema que, ao colocar em cena os protagonistas do discurso e seu referente, permitia compreender as condições históricas da produção de um discurso.
A contribuição de Pêcheux reside no fato de, ao invés de ver os protagonistas do discurso como indivíduos, conseguir visualizá-los como representantes de lugares determinados em uma estrutura social, dos quais decorrem formações imaginárias diferentes, que determinarão diferentes discursos, os quais dependerão da imagem que cada um (indivíduo) faz de seu próprio lugar e do lugar do outro.
A noção de formação ideológica e formação discursiva Por meio do discurso, e também de outras instâncias, a ideologia se materializa.
Desta articulação (discurso/ideologia) surgem dois conceitos em Análise do Discurso: a) O conceito de formação ideológica: Para Pêcheux (citado por Brandão, 1986), “[...] a região do materialismo histórico que interessa a uma teoria do discurso é a da superestrutura ideológica ligada ao modo de produção dominante na formação social considerada.” (p.37). Desta forma, caracteriza o funcionamento da instância ideológica como decorrente da instância econômica, na medida em que fundamenta as relações de (re)produção desta base econômica.
Dessa concepção, que aparece primeiramente no trabalho de Althusser sobre as ideologias, Pêcheux chega à representação do exterior da língua. A instância ideológica, na reprodução de relações de classes, ocorre por meio da interpelação do indivíduo como sujeito ideológico, interpelação que faz com que o mesmo, sem perceber, ocupe um lugar – o seu – em uma das classes sociais. Essas últimas, por seu turno, mantêm relações que são reproduzidas continuamente e garantidas materialmente pelos aparelhos ideológicos do Estado, assim como propostos por Althusser. Tais relações de classes se organizam de modo a estabelecerem ora relações de aliança ou de antagonismos, ora de dominação. Dessa organização de posições políticas e ideológicas resultam as formações ideológicas.
Haroche et al. (citado por Brandão, 1986) definem formação ideológica como um elemento capaz de intervir como força contra outras forças, numa dada formação social. Segundo esses autores, “[...] cada formação ideológica constitui assim um conjunto complexo de atitudes e de representações que não são nem ‘individuais’ nem ‘universais’, mas se relacionam mais ou menos diretamente a posições de classes em conflito umas em relações às outras”. (Haroche et al., citado por Brandão, 1986, p. 38).
São as formações discursivas que determinam o que pode e deve ser dito em uma dada conjuntura, de acordo com a posição e formação ideológica da qual pertence.
b) O conceito de formação discursiva:
Esse conceito foi concebido por Foucault ao interrogar-se sobre as condições históricas e discursivas nas quais se constituem os sistemas de saber, sendo, depois, elaborado por Pêcheux (Brandão, 1986, p.38). Representa, na Análise Discursiva, um lugar central da articulação entre a linguagem e o discurso. Envolve dois tipos de funcionamento:
1. A paráfrase: uma formação discursiva é constituída por um sistema de paráfrases.
2. O pré-construído constitui, segundo Pêcheux, um elo entre a teoria dos discursos e a lingüística. Este termo, introduzido por Henry, designa aquilo que remete a uma construção anterior e exterior, portanto, independente do que é “construído” pelo enunciado. É o elemento que irrompe no discurso como subentendido a priori. (Brandão, 1986, p.39). O pré-construído remete, portanto, a interpelação ideológica, visto que garante o que cada um conhece, pode ver ou compreender e que determina também o que pode ser dito. Assim, o pré-construído é assimilado pelo enunciador no processo de seu assujeitamento ideológico, no momento em que se realiza a sua identificação, enquanto sujeito enunciador, com o sujeito universal da formação discursiva. Ou seja, quando se tem a ilusão de que se é a fonte de seu discurso. É o Espaço em que enunciados são retomados e reformulados num esforço constante de fechamento de suas fronteiras em busca da preservação de sua identidade. É considerada “matriz do sentido”. Representa o mesmo: formação discursiva que regula o fato de que sujeitos falantes, situados numa mesma conjuntura histórica, possam concordar ou não sobre o sentido a ser atribuído às palavras, o que permite a diversidade de sentidos numa mesma língua.
Considerando esse fato, podemos afirmar que uma formação discursiva não está fechada em si mesma. Pelo contrário, seus limites são fluidos e se inscrevem entre diversas formações discursivas, permitindo que a contradição lhe seja/esteja inerente. E é justamente essa contradição que dará, ao discurso, mobilidade, possibilidades de mudanças, maleabilidade, historicidade. Courtine (citado por Brandão, 1986, p.40) observa que o conceito de formação discursiva liga contraditoriamente dois modos de existência do discurso como objeto de análise:
Considerando esse fato, podemos afirmar que uma formação discursiva não está fechada em si mesma. Pelo contrário, seus limites são fluidos e se inscrevem entre diversas formações discursivas, permitindo que a contradição lhe seja/esteja inerente. E é justamente essa contradição que dará, ao discurso, mobilidade, possibilidades de mudanças, maleabilidade, historicidade. Courtine (citado por Brandão, 1986, p.40) observa que o conceito de formação discursiva liga contraditoriamente dois modos de existência do discurso como objeto de análise:
a) O nível do enunciado: diz respeito ao sistema de formação dos enunciados que englobaria ‘um feixe complexo de relações’ funcionando como regras que determinariam o que pode e deve ser dito por um sujeito em uma determinada conjuntura, no interior de uma formação discursiva, porém sob a dependência do interdiscurso desta última, ou seja, sob a égide das relações interdiscursivas.
Nesse nível ocorre “[...] a constituição da ‘matriz do sentido’ de uma formação discursiva determinada no plano dos processos históricos de formação, reprodução e transformação dos enunciados. Esse nível se situa no plano das ‘regularidades préterminais’, aquém da coerência visível e horizontal dos elementos formados.” (Brandão, 1986, p. 41)
b) O nível de formulação: “[...] refere-se ao ‘estado terminal do discurso’ onde os enunciados manifestam certa ‘coerência visível horizontal’. Trata-se do intradiscurso em que a seqüência discursiva existe como um discurso concreto no interior do ‘feixe complexo de relações’ de um sistema de formação.” (Brandão, 1986, p. 41). Discurso enquanto produto, mas em relação com o processo.
Segundo Brandão (1986), para Courtine “[...] toda seqüência discursiva deve ser analisada em um processo discursivo de reprodução/ transformação dos enunciados no interior de uma formação discursiva dada.” (p.41). Segundo este autor, o estudo do intradiscursivo deve estar associado ao estudo do interdiscurso na formação discursiva (Relação texto/contexto).
Sobre a noção de interdiscursividade
A Análise do Discurso, segundo Courtine e Marandin (citado por Brandão, 1986), deve “[...] se propor a um trabalho que faça justamente aflorar as contradições, o diferente que subjaz a todo discurso.” (p.72).
Este tipo de abordagem vai afetar o conceito de formação discursiva, tal como é concebido pela Análise do Discurso, uma vez que a formação discursiva permite reconhecer a coexistência de várias linguagens em uma única. Neste reconhecimento, deve estar subentendida a heterogeneidade, que é inerente à própria formação discursiva; seu caráter fluido, que não permite distinguir seu interior de seu exterior, na medida em que assimila várias outras formações discursivas e suas fronteiras se deslocam conforme os embates da luta ideológica.
A relação discurso-interdiscurso
Maingueneau (citado por Brandão, 1986, p.72) proclama o primado do interdiscurso sobre o discurso ao afirmar que a unidade de análise pertinente não é o discurso, mas um espaço de troca entre vários discursos convenientemente escolhidos.
Tal afirmação sugere duas maneiras de ser interpretada:
a) A especificidade do discurso ocorre por meio de sua relação com os outros discursos.
b) Os discursos apenas teriam sua identidade estruturada a partir da relação interdiscursiva.
Para explicar o que é interdiscurso, Maingueneau distingue universo discursivo, campo discursivo e espaços discursivos. O universo discursivo é compreendido pelo “[...] conjunto de formações discursivas de todos os tipos que interagem numa dada conjuntura.” (Maingueneau, citado Brandão, 1986, p.73). Por ser bastante amplo, esse não pode ser apreendido em sua totalidade.
O campo discursivo é formado por “... um conjunto de formações discursivas que se encontram em concorrência, se delimitam reciprocamente em uma região determinada do universo discursivo.” (Brandão, 1986, p. 73). Pertencentes a um mesmo tempo, as formações discursivas que formam um campo discursivo possuem a mesma formação social, mas divergem na maneira de preenchê-la. Pode se tratar, por exemplo, do campo político, filosófico, gramatical etc. Essa divergência faz com que se
encontrem ou em relação de aliança, de polêmica ou de neutralidade.
O espaço discursivo “[...] são recortes discursivos que o analista isola no interior de um campo discursivo tendo em vista propósitos específicos de análise”. (Brandão, 1986, p.73). Fazer tais recortes requer conhecimento e saber histórico, os quais permitirão levantar hipóteses que poderão ser refutadas ao longo da pesquisa.
Maingueneau propõe, ainda, considerar os fundamentos semânticos dos discursos. Finalmente, conforme Courtine e Marandin (citado por Brandão, 1986, p.74), o interdiscurso consiste em um processo de reconfiguração constante, no qual uma formação discursiva é conduzida a incorporar elementos pré-construídos, produzidos no exterior dela própria. Essa formação discursiva é levada, também, a remeter a seus próprios elementos, redefinir-se e produzir seu retorno, a organizar sua repetição. Entretanto, é também impelida a provocar seu eventual apagamento, esquecimento, ou mesmo, sua denegação.
Diante desta noção, a formação discursiva se define a partir do interdiscurso e se apresenta, portanto, como um domínio aberto e inconsistente. Por se apresentar deste modo, surge a necessidade de se considerar a “equivalência” entre exterior do discurso e interdiscurso, inscrevendo o interdiscurso no coração mesmo do intradiscurso ou, em outros termos, inscrevendo o Outro no mesmo. A impossibilidade de separar a interação dos discursos de seu funcionamento intradiscursivo “[...] decorre do caráter dialógico de todo enunciado do discurso” (Brandão, 1986, p.74)
Esse Outro, longe de ser percebido como alteridade marcada, manifesta, deve ser concebido como ausência, falta, o interdito do discurso. Assim, toda formação discursiva delimita, não só o que deve ser dito, como também o que não deve ser dito dentro de um espaço discursivo. Os enunciados apresentam, assim, dois lados, que são indissociáveis e que devem ser decifrados pelo analista no trabalho interpretativo, de modo que se detecte não só uma formação discursiva, como também a interação que esta mantém com as demais que a compõem.
Duas noções básicas devem ser distinguidas ao se considerar a relação do discurso com seu outro:
a) A noção de intertexto, compreendido como o conjunto dos fragmentos que ele cita efetivamente;
b) A noção de intertextualidade, que abrange os tipos de relações intertextuais definidas como legítimas que uma formação discursiva mantém com as outras (Maingueneau, citado por Brandão, 1986, p.76).
Há dois níveis de intertextualidade:
a) Intertextualidade interna: pela qual um discurso se define a partir de sua relação com discursos do mesmo campo. Nesse nível, vê-se associar a toda formação discursiva uma memória discursiva que torna possível incorporar formulações anteriores, já enunciadas. Maingueneau (citado por Brandão, 1986), afirma que “[...] não existe discurso autofundado, de origem absoluta. Enunciar é se situar sempre em relação a um já-dito que se constitui no Outro do discurso.” (p. 76).
b) Intertextualidade externa: pela qual um discurso define certa relação com outros campos conforme os enunciados destes sejam citáveis ou não. (Brandão, 1986, p.76)
Em um campo enunciativo coexistem diferentes formações discursivas. Tais formas de coexistência delineiam:
a) Um campo de presença: compreende todos os enunciados já formulados alhures e que são retomados em um discurso a título de verdade admitida ou pressuposto necessário. Compreende ainda os enunciados que são julgados excluídos.
a) Um campo de presença: compreende todos os enunciados já formulados alhures e que são retomados em um discurso a título de verdade admitida ou pressuposto necessário. Compreende ainda os enunciados que são julgados excluídos.
b) Um campo de concomitância: envolve os enunciados que dizem respeito a domínios de objetos diferentes e pertencentes a discursos totalmente diversos, mas que atuam entre os enunciados estudados de maneira que correspondam a várias funções: ora como confirmadores de uma premissa, ora como elos na transferência para outros conteúdos; ora porque funcionam como “[...] instância superior com a qual é preciso confrontar e submeter certas proposições que são afirmadas.” (Brandão, 1986, p.78).
c) Um campo de memória: engloba os enunciados que não são mais discutidos, mas que estabelecem redes de filiação, de gênese, de transformação, de continuidade e de descontinuidade histórica.
Courtine (citado por Brandão, 1986) distingue: a) Um domínio de memória: diz respeito ao conjunto de seqüências discursivas preexistentes, a seqüência discursiva de referência. Ambas constituem redes de formulações, que nos permitirão verificar os efeitos de memória que a enunciação produz em um discurso, podendo ser esses efeitos de memória, tanto uma lembrança, uma redefinição, uma transformação como, também, um esquecimento, uma ruptura e/ou uma denegação do já-dito.
A noção de memória discursiva, ao eleger o que deve e o que não deve vir à tona numa enunciação, exerce uma função ambígua na produção de efeitos de sentido, visto que ao mesmo tempo em que recupera o passado, elimina-o com os apagamentos que opera. De um jeito ou de outro, a memória irrompe na atualidade do acontecimento.
a) Domínio de atualidade: reúne um conjunto de seqüências discursivas que coexistem em uma conjuntura histórica determinada e se inscrevem na instância do acontecimento.
a) Domínio de atualidade: reúne um conjunto de seqüências discursivas que coexistem em uma conjuntura histórica determinada e se inscrevem na instância do acontecimento.
b) Domínio de antecipação: agrupa seqüências discursivas que entretêm, no nível intradiscursivo, relações interpretáveis como efeitos de antecipação.
Assim como o domínio de memória nos revela um “já dado” do discurso, o domínio de antecipação nos remete às possibilidades de relações de um discurso atual com outros discursos. Desta forma, este domínio também nos mostra a infinidade do processo discursivo. Aponta, ainda, para a possibilidade de, em uma análise do discurso, poder-se construir um domínio de antecipação que lhe sirva de alvo.
Para Courtine (citado por Brandão, 1986, p.80), a existência de uma formação discursiva como ‘memória discursiva’ e a caracterização de ‘efeitos de memória’, em discursos produzidos em uma dada conjuntura histórica, devem ser articulados com dois níveis de descrição de uma formação discursiva:
a) Nível interdiscursivo: em que os objetos chamados “enunciados” existem no tempo longo de uma memória (tradição cultural transmitida de geração a geração e regulada pelas instituições, tal como propostas por Althusser).
b) Nível intradiscursivo: em que as formulações são tomadas no tempo curto da atualidade de uma enunciação.
A formação discursiva pode se inscrever:
a) Na ordem de uma memória plena, retomando elementos do passado e reatualizando-os (estratégia da repetição).
b) Na ordem de uma memória lacunar, funcionando como produtora de deslocamentos, vazios, esquecimentos (estratégia do apagamento).
A contribuição da Psicanálise para a Análise de Discurso
Sobre a noção de sujeito
Segundo Brandão (1986, p.45), a reflexão sobre a língua tem seguido duas tendências. Segundo a epistemologia clássica, a língua tinha como função representar o real. Assim, um enunciado era considerado verdadeiro se correspondesse a um estado de coisas existentes. Nessa tendência representativa não se colocava a questão da subjetividade.
Opondo-se a esse paradigma, surge uma nova maneira de ver a língua, apreendendo-a enquanto função demonstrativa-domínio do mostrar. A partir desta perspectiva, “[...] o sujeito passa a ocupar uma posição privilegiada, e a linguagem passa a ser considerada o lugar da constituição da subjetividade. E porque constitui o sujeito, pode representar o mundo.” (Brandão, 1986, p.45)
Orlandi (citado por Brandão, 1986, p.46), distingue três etapas na trajetória da noção de sujeito nas teorias lingüísticas:
1ª fase: As relações interlocutivas estão centradas na idéia de interação, em que o eu e o tu conversam harmonicamente.
Orlandi (citado por Brandão, 1986, p.46), distingue três etapas na trajetória da noção de sujeito nas teorias lingüísticas:
1ª fase: As relações interlocutivas estão centradas na idéia de interação, em que o eu e o tu conversam harmonicamente.
2ª fase: Nesta surge a idéia de conflito, causado devido à “tirania”10 do tu sobre o eu.
3ª fase: A Análise do Discurso, ao apreender o sujeito na sua dispersão, diversidade, ou seja, ao reconhecer no mesmo uma contradição que lhe é inerente, dada sua incompletude, procura romper com a circularidade dessa estrutura dual.
Neste modo de relação, o sujeito é ele mais a complementação do outro, e o centro da relação está no espaço discursivo criado entre o eu e o tu.
A subjetividade em Benveniste
A noção de subjetividade nos estudos lingüísticos foi retomada por Benveniste, que se preocupou em analisar o processo de reprodução de um enunciado, buscando nele detectar a manifestação do sujeito. Entendendo a enunciação como um processo de apropriação da língua para dizer algo, atenta para duas questões:
a) “Para ele, a língua é apenas uma possibilidade, que ganha concretude somente no ato da enunciação.” (Brandão, 1986, p.46).
b) Além de colocar a questão da significação na instância discursiva, introduz a figura do locutor e a questão da subjetividade.
Para esse autor, a subjetividade se daria por meio da capacidade de o locutor se posicionar no discurso e de propor-se como sujeito do mesmo. Essa subjetividade, fundada no exercício da língua, seria detectada no discurso por meio dos pronomes pessoais eu e tu, na medida em que tais pronomes apresentam a marca da pessoalidade.
Porém, Benveniste distingue eu e tu pela marca da subjetividade. Reconhece o primeiro como pessoa subjetiva, que transcende o tu, e trata esse último como pessoa não subjetiva, apesar de concebê-los como termos complementares e reversíveis. Um terceiro termo na relação, o ele, seria o opositor, a não-pessoa. Não há o reconhecimento, portanto, da subjetividade neste termo.
Ao enfatizar o papel do eu na relação discursiva, Benveniste abre uma brecha para uma crítica de sua teoria, a saber: “[...] a subjetividade é inerente a toda linguagem e sua constituição se dá mesmo quando não se enuncia o eu.” (Brandão, 1986, p.48).
Acrescenta ainda que, mesmo nos discursos em que o eu não aparece, há a enunciação desse sujeito de “um outro lugar” e que, nem por isso, deixa de haver constituição de subjetividade. E, finalmente, Benveniste acaba por contradizer-se ao mencionar a diferença entre enunciação discursiva e enunciação histórica, não atribuindo a esta última, marcas de subjetividade, pois, segundo um de seus pressupostos, toda enunciação é um ato de apropriação da língua. E esta só pode ser apropriada por um sujeito.
O sujeito descentrado: o eu e o outro
Segundo tal idéia, o eu fala de acordo com o que acredita que o tu irá responder. Ou seja, a fala do eu
estaria completamente vulnerável à relação com o tu. Há teorias que, diferentemente da de Benveniste, que concebia o sujeito enquanto ser único, origem e fonte do sentido, propõem algumas abordagens que compreendem diferentemente a noção de sujeito. Essas abordagens consideram a história, ou seja, o lugar e o tempo no qual o sujeito se insere, como fundamental para determinar seu discurso. Ao remeterem-se ao histórico, automaticamente remetem-se à noção de sujeito ideológico. Sendo seu discurso um recorte, o sujeito o situa diante de outros recortes, ou seja, em relação aos discursos de outras pessoas. Tais abordagens consideram dois níveis de discurso:
a) Nível intradiscursivo: no qual o sujeito ajusta a sua fala de acordo com o outro.
b) Nível interdiscursivo: em que o discurso do sujeito é situado entre outros discursos historicamente já constituídos.
b) Nível interdiscursivo: em que o discurso do sujeito é situado entre outros discursos historicamente já constituídos.
Nesta abordagem, a relação eu/tu diferencia-se da de Benveniste. Aqui, o outro é considerado como constitutivo do eu. O sujeito divide, então, um espaço discursivo com o Outro.
Podemos citar como importantes colaboradores desta noção de subjetividade, ainda que difiram em alguns pontos centrais, os nomes de Bakhtin, que discute a questão do monologismo X dialogismos; Ducrot, com os conceitos de locutor e enunciador, apesar de sua perspectiva ser diferenciada da apresentada pela Análise do Discurso, visto que exclui a noção de historicidade; e, finalmente, Authier-Revuz, com sua teoria sobre a heterogeneidade discursiva. Authier-Reviuz demonstra como a psicanálise questiona a unicidade significante da noção homogeneizadora da discursividade. Entendendo o sujeito enquanto ser dividido entre consciente e inconsciente e, também, como um efeito de linguagem, a psicanálise busca suas formas de constituição na diversidade de uma fala heterogênea, a qual é conseqüência de sua cisão.
Para a psicanálise, o “[...] inconsciente pode ser recuperado, reconstruído a partir de traços deixados por esses apagamentos, esquecimentos, cabendo ao analista a tarefa da reconstrução. Reconstrução que se faz por um trabalho de regressão ao passado na e pela palavra, buscando-se ‘a restauração do sentido pleno [...] das expressões empalidecidas’ (Freud), a ‘regeneração do significante’ (Lacan).” (Brandão, 1986, p.55)
O trabalho analítico visa, mediante associações livres, captar a articulação entre o discurso e seu avesso12, de modo a fazer emergir o que, na fala do sujeito, ele diz à sua própria revelia e à de seu desejo. Assim, o analista, em seu trabalho de escuta, deve estar atento para a emersão de diversos discursos dentro de uma única cadeia verbal, pois “[...] sob nossas palavras ‘outras palavras’ se dizem.” (Brandão, 1986, p.55). A partir da concepção de discurso heterogêneo perpassado pelo inconsciente, detectamos sua articulação com a teoria do descentramento do sujeito falante, na qual este último apresenta as seguintes características:
a) O sujeito é dividido, clivado, cindido: o sujeito não se reduz à dualidade especular eu-outro. Há também, um terceiro elemento que o constitui: o inconsciente freudiano.
Uma explicitação de tais conceitos pode ser encontrada, de forma sucinta, em Brandão (1986, p.50-61). Segundo Clément (apud Brandão, 1986, p.54), o avesso é a pontuação do inconsciente; não é um outro discurso, mas o discurso do outro: isto é, o mesmo mas tomado ao avesso, em seu avesso. Inconsciente que, concebido como a linguagem do desejo (censurado), é o elemento de subversão que
provoca a cisão do eu. (Brandão, 1986, p.55).
b) O sujeito é descentrado: com a “descoberta” do inconsciente por Freud, o eu perde a sua posição central. Esta posição só seria possível, no nível da ilusão. Ainda que tal ilusão seja necessária à constituição do sujeito, é preciso conhecer a realidade desta ilusão.
b) O sujeito é descentrado: com a “descoberta” do inconsciente por Freud, o eu perde a sua posição central. Esta posição só seria possível, no nível da ilusão. Ainda que tal ilusão seja necessária à constituição do sujeito, é preciso conhecer a realidade desta ilusão.
c) O sujeito é feito de linguagem: isto porque, segundo Lacan (citado por Brandão, 1986), “a linguagem é a condição do inconsciente” e, por ser o inconsciente “discurso do outro” (p. 56).
Sentido e Sujeito na Análise do Discurso
Sentido e Sujeito na Análise do Discurso
A Análise do Discurso toma para si essa noção de sujeito que se constitui na relação dinâmica entre identidade e alteridade. Para ela, o sujeito só constrói sua identidade na interação com o outro. E, no centro desta relação, está o espaço discursivo criado entre ambos, está o texto. Desta concepção, surgem duas idéias básicas que norteiam esta teoria:
a) A idéia de que o sentido, assim como o sujeito, não é dado a priori, mas constituído no e pelo discurso.
b) A idéia do descentramento do sujeito que, embora fundamental, pois não existe discurso sem sujeito, perde sua essencialidade ao integrar-se no funcionamento dos enunciados.
O quadro epistemológico da Análise do Discurso, atravessado por uma teoria da subjetividade de cunho psicanalítico, centra sua problemática nos sistemas de representação do sujeito. Nele, ideologia e inconsciente estão materialmente ligados e atuam de maneira análoga na formação do sujeito e na constituição do sentido.
A teoria não-subjetivista da enunciação proposta por Pêcheux
A teoria não-subjetivista da enunciação proposta por Pêcheux
Pêcheux formula essa teoria com base nas colocações de Althusser, segundo as quais, a ideologia interpela os indivíduos em sujeitos. Para ele, os indivíduos tornam-se sujeitos de seu discurso por meio das “[...] formações discursivas que representam ‘na linguagem’ as formações ideológicas que lhes correspondem.” (Pêcheux, citado por Brandão, 1986, p.64). Desta forma, ao acreditar-se sujeito, o indivíduo submete-se livremente às ordens do Sujeito (a ideologia), de maneira que aceita livremente seu próprio assujeitamento.
Diante da colocação de Althusser, ficam expostos: a) Os mecanismos de funcionamento interno da ideologia: como os indivíduos são assujeitados por ela; como se impõe a “figura” de um Sujeito absoluto (ideologia), que deve ser respeitado e distinguido entre os demais sujeitos; e, finalmente, como a ideologia se impõe enquanto algo verdadeiro e que deve ser aderido por todos, sob pena de serem repreendidos, pelos aparelhos repressores do Estado, os indivíduos que optarem por não fazê-lo. b) A ambigüidade constitutiva da noção de sujeito que, ora apresenta uma subjetividade livre e autônoma para tomar iniciativas, ora revela uma subjetividade assujeitada a uma ordem superior, submetida às condições de produção.
Portanto, o espaço ocupado pelo sujeito é um espaço tenso. Pêcheux cria o termo forma-sujeito para designar o sujeito afetado pela ideologia. Baseando-nos nesta teoria, podemos ratificar a afirmação de que não existem, a priori, sujeito e sentido. Ambos só se constituem dentro de uma formação discursiva. “Concebe-se, assim, o sentido como algo que é produzido historicamente pelo uso e o discurso como o efeito de sentido entre locutores posicionados em diferentes perspectivas.” (Brandão, 1986, p.65)
A ilusão discursiva do sujeito O sujeito, acometido por dois tipos de esquecimento, cria uma realidade discursiva ilusória: a) Esquecimento número 1: por sua natureza inconsciente e ideológica, dá ao sujeito a ilusão de ser fonte exclusiva do sentido de seu discurso. Por meio deste tipo de esquecimento, o sujeito “escolhe” uma dentre certas seqüências, rejeitando, apagando as demais, a fim de atribuir um “determinado” sentido. b) Esquecimento número 2: de natureza pré-consciente ou consciente, dá ao sujeito a ilusão de que seu discurso reflete o conhecimento objetivo que tem da realidade. O sujeito é capaz de retomar seu discurso para explicitar a si mesmo o que diz. Ele seleciona o que deve ser dito e o que não deve ser dito. Tal esquecimento constitui o ponto de articulação entre a lingüística e a teoria do discurso.
A idéia de um sujeito uno, origem de sentido, mesmo ilusória, forma o sujeito. Apesar de necessária, essa concepção é criticada pela Análise do Discurso que, ao retomar a noção de dispersão do sujeito, tal como proposta por Foucault, concebe o discurso como uma dispersão de textos. E o texto como uma dispersão do sujeito.
Por outro lado, é justamente essa ilusão do sujeito que faz com que o mesmo, “impulsionado por uma vocação totalizante” (Brandão, 1986, p.66) seja capaz de produzir um texto coerente, harmônico. Essa unidade textual é um efeito discursivo que deriva do princípio do autor, o qual seria um regulador de discursos. Segundo as concepções foucaultianas, “o autor não seria aquele entendido como o indivíduo que fala, [...] mas o elemento que centraliza, que ordena, que dá unidade ao discurso, excluindo os possíveis elementos desviantes pelo ‘jogo de uma identidade que tem a forma da individualidade e do eu’.” (Brandão, 1986, p.67). O princípio do autor limita o acaso do discurso, ordena sua desordem.
Segundo Brandão (1986, p.67), Orlandi e Guimarães ampliam a noção de autoria ao especificá-la como necessária para qualquer discurso e colocá-la na origem da textualidade. Para esses autores, “[...] a unidade construída a partir da heterogeneidade discursiva através do princípio de autoria se faz por uma função enunciativa”. Assim, o sujeito falante teria as seguintes funções:
a) locutor: aquele que se representa como eu no discurso; Por discurso enquanto dispersão de texto entenda-se a possibilidade de um discurso estar atravessado por diversas formações discursivas. Perda da centralidade de um sujeito uno que passa a ocupar várias posições enunciativas.
b) enunciador: é a perspectiva que esse eu constrói;
c) autor: é a função social que esse eu assume enquanto produtor da linguagem. O autor é, dentre as dimensões enunciativas do sujeito, o que está mais determinado pela exterioridade (contexto sociohistórico) e mais afetado pelas exigências de coerência, não-contradição e responsabilidade. (Brandão, 1986, p.68)
A partir da afirmação de Brandão (1986), é possível apreender como a Análise do Discurso concebe a constituição da subjetividade. Para essa teoria, o sujeito não é totalmente livre, tampouco completamente assujeitado. Ele atravessa e é atravessado pelo seu “próprio” espaço discursivo e pelo espaço discursivo do outro, pela incompletude e pelo desejo de completude. Move-se, ainda, entre “[...] a dispersão do sujeito e a ‘vocação totalizante’ do locutor em busca da unidade e coerência textuais; entre o caráter polifônico da linguagem e a estratégia monofonizante de um locutor marcado pela ilusão do sujeito como fonte, origem do sentido.” (Brandão, p.68).
Dispositivo de análise da Análise do Discurso
Por serem as condições de produção constituintes do discurso, esse conceito se tornou básico para a Análise de Discurso, ao ponto de se tornar o objeto de sua análise. Considerando que a proposta da Análise do Discurso consiste em “ver além das aparências”, ou seja, detectar no discurso do indivíduo não só os conteúdos conscientes, mas também os inconscientes e ideológicos, propomo-nos a refletir agora sobre como isso seria possível. Dito de outro modo, dispomo-nos a pensar em como se daria a apreensão das condições de produção de um discurso.
Fizemos, ao longo deste trabalho, um percurso que mostrou como a linguagem funciona, bem como sua articulação com outras disciplinas. Tal trajetória permitiu que emergissem questões concernentes ao knowhow, ao como deve proceder o analista para apreender e compreender como o histórico atravessa a linguagem e confere sentido à língua, ao mesmo tempo que constitui o sujeito.
Segundo Orlandi (1996), “A Análise de Discurso não é um nível diferente de análise, quando pensamos em níveis como o fonético, o sintático, o semântico. É, antes, um ponto de vista diferente. Isto é, o problema é antes de tudo metodológico.” (p.116). Desta forma, Orlandi propõe que a noção fundamental é a de funcionamento, ou seja, que a Análise de Discurso visa destacar o modo como a linguagem funciona.
Então, como deve proceder o analista? Que escuta deve estabelecer? Orlandi (1999) sugere a construção de um dispositivo de interpretação, que teria como característica “[...] colocar o dito em relação ao não dito, o que o sujeito diz em um lugar com o que é dito em outro lugar, o que é dito de um modo com o que é dito de outro, procurando ouvir, naquilo que o sujeito diz, aquilo que ele não diz mas que constitui igualmente os sentidos de suas palavras.” (p.59).
Então, como deve proceder o analista? Que escuta deve estabelecer? Orlandi (1999) sugere a construção de um dispositivo de interpretação, que teria como característica “[...] colocar o dito em relação ao não dito, o que o sujeito diz em um lugar com o que é dito em outro lugar, o que é dito de um modo com o que é dito de outro, procurando ouvir, naquilo que o sujeito diz, aquilo que ele não diz mas que constitui igualmente os sentidos de suas palavras.” (p.59).
Este dispositivo deve permitir a explicação dos jogos simbólicos nos quais a ideologia e o inconsciente se encontram presentes, os processos identificatórios e os gestos de interpretação, os quais fazem com que os sujeitos (se) signifiquem. Refere-se à qualidade de todo discurso estar tecido pelo discurso do outro, de toda fala estar atravessada pela fala do outro. Dissemos anteriormente neste trabalho que o sujeito, ao falar, ajusta sua fala de acordo com seu ouvinte. Esta colocação é decisiva no momento da interpretação, visto que, no discurso do sujeito, já estará contida a interpretação do mesmo sobre a relação que está estabelecendo com o analista e sobre a situação, artificial, da coleta de dados.
Por outro lado, o analista, ao descrever os dados coletados, também estará “contaminando-os” com sua interpretação. Vemos, então, a implicação mútua nesta relação e disto concluímos que não há nenhum tipo de neutralidade neste discurso objeto. Por isso, é necessário que, na construção deste dispositivo teórico, seja contemplada a intervenção destes objetos simbólicos, de maneira que a posição do analista seja não só incluída neste discurso, mas, principalmente, relativizada de acordo com as várias posições que ele vai assumindo diante deste discurso, a saber, a de ouvinte, a de leitor, a de analista. Somente atento a esses movimentos interpretativos, será capaz, então, de contemplar o processo de produção de sentidos em suas condições. E isso só pode ser possível sob uma mediação teórica bem fundamentada e permanente, em todos os passos da análise.
Nesse sentido, podemos dizer que não há um dispositivo de interpretação absoluto, dado a priori. Ao contrário, este, assim como o discurso, constrói-se, particulariza-se na e a partir da relação, da questão que ele coloca diante dos dados coletados, que constituirão seu corpus e os quais ele visa compreender sob a luz de uma teoria. O corpus deve ser constituído em relação aos objetivos da análise e à sua temática. Deve visar atingir a exaustividade vertical, ou seja, a análise mais ampla e profunda de um recorte, isto é, de um discurso dado dentro de uma determinada conjuntura. Essa exaustividade vertical “[...] trata de ‘fatos’ da linguagem com sua memória, sua espessura semântica, sua materialidade lingüística.” (Orlandi, 1999, p.63).
Assim, à construção do corpus temos, simultaneamente, a construção da “perspectiva” da análise, pois eleger o que faz parte do corpus já compreende decidir acerca de propriedades discursivas. Conseqüentemente, dizemos que, assim como o corpus é construção do próprio analista, ou seja, faz parte do “seu olhar”, do seu ponto de vista, assim, também, o é a análise. Porém, esta última deve ser o menos subjetiva possível, de maneira que atinja o objetivo de explicitação dos modos de produção de sentido.
Uma outra questão fundamental que devemos observar sobre a interpretação é no tocante a seus resultados. Como já dissemos, ao tomar um discurso como objeto, estamos fazendo um recorte de uma dada situação. Isso implica em uma questão que julgamos decisiva: a nossa interpretação é apenas uma dentre infinitas possibilidades de abordagem. Nós não esgotamos o objetivo em uma descrição/interpretação. Questões diferentes, postas por diversos analistas, conduzem a resultados distintos para “um mesmo” objeto. E, por isso, este tipo de análise se torna interessante: porque, de alguma forma, reproduz os movimentos do próprio funcionamento interno da língua, que se coloca “no vazio”, para ser preenchida de sentidos (polissemia) pelos sujeitos. A língua é prenhe e vulnerável ao constante vir a ser dos sujeitos. Assim, também o é a interpretação.
Sobre o método
Há uma passagem fundamental entre superfície lingüística (o material de linguagem bruto coletado) e o objeto discursivo (o material que já recebeu um primeiro tratamento de análise superficial). Ao utilizar a de-superficialização, o analista é capaz de observar, por meio dos vestígios que deixam no discurso, as formações imaginárias em suas relações de sentido e de forças. Ao construir o objeto discursivo, o analista pode observar o dizível e o não dizível de tal discurso, o modo como são afetados por diferentes memórias discursivas, os processos de identificação e os jogos simbólicos que estabelecem entre si (os sujeitos) e com a ideologia. Há, aqui, a apreensão do processo discursivo. Ao fazê-lo, o analista retoma conceitos e noções, entrelaçando, constantemente, teoria, corpus e análise. Desse modo, vai detectando como a história presentifica-se na língua, por meio de processos como a paráfrase, metáfora e sinonímia.
Segundo Orlandi (1999), “[...] fatos vividos reclamam sentidos e os sujeitos se movem entre o real da língua e o da história, entre o acaso e a necessidade, o jogo e a regra, produzindo gestos de interpretação.” (p. 68).
Portanto, por meio de seu trabalho de análise, o analista pode detectar como os sujeitos e os sentidos se constituem, se posicionam na história, e como a língua atravessa e é atravessada por esses sujeitos e sentidos.
Algumas Considerações
Algumas Considerações
Este trabalho deixou de abordar alguns preceitos básicos da Análise de Discurso, ainda que os mesmos se encontrem subentendidos no texto. O objetivo de situar uma explicação mais elaborada sobre as fases do processo analítico e sobre os processos de paráfrase, sinonímia e metáfora poderá ser encontrada em Orlandi (1999, p. 77-81). Para a abordagem metodológica, Orlandi (1996) propõe, ainda, tipos de discursos, que podem ser vistos, principalmente, em dois capítulos: Tipologia de Discurso e Regras Conversacionais e Sobre tipologia de discurso. E para a obtenção de outras informações sobre a contribuição da Lingüística para a Análise de Discurso, Fiorin (1994) indica os elementos básicos que compõem a Análise de Discurso.
Quando pensamos na utilização da técnica de Análise do Discurso na pesquisa, podemos afirmar que tal técnica “fala por si própria”. No entanto, dado o campo discursivo abordado neste trabalho, algumas sugestões poderão ser pertinentes.
Toda pesquisa visa captar as representações e reações dos indivíduos em dada situação. Só podemos ter acesso a esse “conteúdo” por meio da fala dos participantes, ou melhor, de seu discurso, concebendo-o, agora, como o concebe a Análise do Discurso. Portanto, o objeto de análise de uma pesquisa pode ser um discurso. Processo que consiste em um primeiro tratamento do “texto bruto” pelo analista. Trata-se da análise do que se apresenta em sua sintaxe e enquanto processo de enunciação. A partir desta análise, compreendemos como o discurso se textualiza. (Orlandi, 1999, p.65)
Segundo Fiorin (1994, p.86), para a retórica clássica, a Metáfora é a substituição de uma palavra por outra, quando há uma relação de similaridade entre o termo de partida (substituído) e o de chegada (substituinte) e Metonímia é a substituição de uma palavra por outra, quando há uma relação de contigüidade entre o termo substituído e o substituinte. Porém, para esse autor, essas definições são insuficientes, pois ambos os processos são procedimentos discursivos de constituição do sentido.
Nelas o narrador rompe, de maneira calculada, as regras de combinatória das figuras, criando uma impertinência semântica, que produz novos sentidos. Toda vez que extrapolamos o “texto” e atingimos o “contexto”, temos condições de pensarmos como se configuram as relações em determinado local ou situação, ou seja, podemos apreender como tais relações aparecem historicamente; quais fatores estabelecem e impõem sua cultura; como as pessoas envolvidas se vêem impelidas a se tornarem “sujeitos”; quais ideologias que cada parte dessas relações (re)produzem, como se dá esse encontro ou confronto; se e como elas resolvem as questões que remetem à crença e ao simbólico, entre outros. Enfim, é possível detectar que significados atribuem a essas relações, como (se) significam e (se) constituem como sujeitos destas relações. Enfim, esse modo de 'olhar' está fundamentado nos princípios teóricos da Análise do Discurso.
Toda pesquisa visa captar as representações e reações dos indivíduos em dada situação. Só podemos ter acesso a esse “conteúdo” por meio da fala dos participantes, ou melhor, de seu discurso, concebendo-o, agora, como o concebe a Análise do Discurso. Portanto, o objeto de análise de uma pesquisa pode ser um discurso. Processo que consiste em um primeiro tratamento do “texto bruto” pelo analista. Trata-se da análise do que se apresenta em sua sintaxe e enquanto processo de enunciação. A partir desta análise, compreendemos como o discurso se textualiza. (Orlandi, 1999, p.65)
Segundo Fiorin (1994, p.86), para a retórica clássica, a Metáfora é a substituição de uma palavra por outra, quando há uma relação de similaridade entre o termo de partida (substituído) e o de chegada (substituinte) e Metonímia é a substituição de uma palavra por outra, quando há uma relação de contigüidade entre o termo substituído e o substituinte. Porém, para esse autor, essas definições são insuficientes, pois ambos os processos são procedimentos discursivos de constituição do sentido.
Nelas o narrador rompe, de maneira calculada, as regras de combinatória das figuras, criando uma impertinência semântica, que produz novos sentidos. Toda vez que extrapolamos o “texto” e atingimos o “contexto”, temos condições de pensarmos como se configuram as relações em determinado local ou situação, ou seja, podemos apreender como tais relações aparecem historicamente; quais fatores estabelecem e impõem sua cultura; como as pessoas envolvidas se vêem impelidas a se tornarem “sujeitos”; quais ideologias que cada parte dessas relações (re)produzem, como se dá esse encontro ou confronto; se e como elas resolvem as questões que remetem à crença e ao simbólico, entre outros. Enfim, é possível detectar que significados atribuem a essas relações, como (se) significam e (se) constituem como sujeitos destas relações. Enfim, esse modo de 'olhar' está fundamentado nos princípios teóricos da Análise do Discurso.
Finalmente, destacamos que a Análise do Discurso pode contribuir para a postura pela qual o pesquisador abordará seus dados. Ou seja, ao pressupor o descentramento do sujeito e a relativização frente a outros discursos, ou mesmo, ao não-dito, esta teoria relativiza, também, o papel, a posição do analista frente à sua pesquisa, assim como relativiza a abrangência dos resultados de sua análise. Ao apontar a não-neutralidade do pesquisador diante de seu objeto e dos resultados da pesquisa, ela nos obriga a refletir sobre “de que lugar estamos falando”, ou seja, ela nos atenta para a existência do entrelaçamento entre o compromisso político e o comprometimento ético que está fundamentando nossa ação. Aponta-nos, ainda, para o que estamos entendendo como a ‘ferida narcísica’ do homem-pesquisador, visto que, ao inserir o analista no processo/produto de seu estudo, a Análise do Discurso, além de relativizar o seu poder de argumentação, de intervenção, de apreensão da realidade que se apresenta, impõe-lhe também a consciência de seus limites, de sua incompletude, de sua incoerência interna, de sua existência caótica. E, como se por um reflexo, mostra, ainda, o mesmo funcionamento na língua e na ciência.
Porém, há que se ver algo de positivo nisto tudo: é devido a esta incerteza, aos nossos limites, à consciência de nossa finitude e pequenez diante da vida e da história, que faz emergir de nós mesmos e do seio da ciência, a motivação para a superação. Ainda que, nessa transcendência/superação, estejam previstas nossas constantes metamorfoses, que só podem tomar forma ao se viver (o sujeito) e ao se fazer ciência (o conhecimento).
Abstract: This article has as its main objective to discuss the way by which Discourse Analysis has historically developed as a theoretical and methodological field of study which provides subsidies for the analysis of the discourse. Based on the concepts presented by Orlandi (1996; 1999), Brandão (1996) and Fiorin (1994), it points to the main contributions by Marxism, Psychoanalysis and Linguistics for the development of this field of knowledge. It is pointed out that the concepts brought about by the Discourse Analysis constitute an important technical instrument for research both in Psychology and in other areas.
Keywords: Discourse Analysis; Marxism; Psychoanalysis; Linguistics
Sobre a Análise do Discurso
Revista de Psicologia da UNESP, 4(1), 2005. 40
Maria Alice Siqueira Mendes e Silva
Referências
Bakhtin, M. (1992). Marxismo e filosofia da linguagem (6a. ed., M. Lahud e Y. T. Vieira, trad.). São Paulo: Hucitec.
Brandão, H. H. N. (1986). Introdução à análise do discurso (5a. ed.). Campinas, SP: Editora da UNICAMP.
Fiorin, J. L. (1994). Elementos de análise do discurso (4a. ed.). São Paulo: Contexto. Orlandi, E. P. (1999). Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes.
Orlandi, E. P. (1996). A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso (4a. ed.). Campinas, SP: Pontes.
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